No Ritmo da Vida (Jump, Darling, 2020)
Ele almeja pelo futuro… ela não tem um por qual
almejar.
Dirigido por
Phil Connell e protagonizado por Thomas Duplessie e Cloris Leachman, “No Ritmo da Vida” é um drama canadense
lançado em 2020 que conta a história de Russell, um jovem artista tentando
encontrar o seu caminho na vida depois de questionar a própria carreira e sair
de um relacionamento de anos, e de Margaret, uma mulher de mais de 90 anos que
não quer ir para a casa de repouso para a qual a filha a quer mandar, mas está
cada vez mais difícil continuar vivendo sozinha nessa idade. É um filme
sensível e doloroso sobre pertencimento e sobre envelhecimento, com duas
pessoas em fases tão diferentes da vida, mas igualmente buscando seu lugar.
Quando
Russell não sabe mais para onde ir e sabe que Margaret tem dinheiro que ele
pode usar, ele acaba na casa da avó sem saber o quanto ambos precisam um do
outro. “No Ritmo da Vida” constrói
uma narrativa bonita enquanto Russell “se esconde” da vida em uma cidade
pequena que não lhe dará um futuro artístico como a drag queen de sucesso que ele sonha em ser, mas ele talvez precise
daquela pausa… ele precisa pensar sobre ele mesmo, sobre quem é, quem quer ser,
e precisa redescobrir que ele se importa.
Margaret, por sua vez, percebe que gosta da companhia do neto, gosta de ter
alguém que prepara o jantar para ela e que lhe faz companhia em seus dias
solitários.
É um drama competente,
que explora as realidades distintas de Russell e Margaret. Russell foi embora
para ser ator, sua carreira não tem dado certo e o agora ex-namorado não aprova
a sua vontade de “ser uma drag queen
de bar famosa”, mas é o que ele quer fazer… é o que ele faz com talento quando
encontra o único bar LGBTQIA+ da cidade pequena em que está morando por uns
dias enquanto fica ao lado de Margaret. Suas performances, por sua vez, são
marcadas por sentimentos conflitantes de liberdade, revolução, raiva e
frustração. Há muita beleza e muita força quando ele dança sozinho no bar
fechado e coloca tudo para fora, por exemplo, ou quando “confronta” o babaca
que o vem usando…
Margaret,
por sua vez, não sabe bem para que
ela está vivendo. É dolorosa a cena na qual Russell está indo embora e ela o
chama da janela para ajudá-la a entrar no chuveiro, e é naquele momento que ele
percebe que ele pode ficar e a ajudar, pelo menos por uns dias. Tudo é muito
complexo, porque eu entendo a preocupação da filha querendo mandá-la para uma
casa de repouso onde ela estará cuidada 24 horas por dia, mas eu também entendo
a Margaret não querendo sair da casa na qual ela passou a vida toda, onde as
poucas memórias que ainda não lhe escaparam estão… memórias como aquelas que
habitam uma foto sua patinando no gelo há tanto tempo.
Russell e
Margaret são opostos complementares. Ele sabe o que gosta, está descobrindo seu
lugar no mundo e o que ele quer fazer, quem quer ser, mas precisa de coragem
para lançar-se. Ela, por sua vez, está cansada… em uma das cenas mais dolorosas
do filme, ela fala sobre nem saber mais o
que ela gosta de fazer, e é evidente a pergunta que a consome. Quando
Russell tenta ajudá-la levando para uma noite de baralho na casa de uma
conhecida, como ela ia anos antes, fica ainda
mais claro o quanto ela se sente deslocada… o quanto aquilo não significa
nada para ela. E Russell sabe que não poderá ficar ali para sempre, mas não
quer abandoná-la, por isso deixa tudo arrumado para que ela seja cuidada…
A personagem
da mãe de Russell e filha de Margaret é um meio-termo interessante que
enriquece a narrativa e que proporciona outro
ponto de vista para ambas as histórias e as intersecções… no fim, ela só quer entender. Ela se preocupa com a
mãe porque ela não quer a casa de repouso, não quer ir para a casa dela e
tampouco pode ficar sozinha; ela se preocupa com o filho porque ele não está
fazendo audições enquanto está ali e ela não sabe qual seu plano para o futuro
e se ele precisa de algo. Mas seu coração está no lugar certo. Sua preocupação
e intromissão vem do amor que sente por ambos. As cenas com o ex-namorado de
Russell ou assistindo ao filho no bar no fim provam isso…
A conclusão
do filme nos mostra os destinos de ambos em paralelo, em uma cena triste,
melancólica e com um quê de poesia tocante. Margaret está de fato cansada… ela
não tem mais o marido, não tem mais hobbies,
não consegue fazer as coisas sozinha e não quer sentir que depende dos outros
ou que é um peso para eles, então ela escolhe partir desse mundo nos seus
termos – diferente do marido, ela o faz em paz e silenciosamente na própria
cama. Em paralelo, Russell sobe ao palco onde quer estar, inspirado pela história da mulher que fora uma patinadora em algum
momento do passado… sua primeira performance é em homenagem a Margaret e à sua
história…
Ao seu legado
que viverá através dele e de sua drag
queen.
Doloroso e
belo, “No Ritmo da Vida” é um ótimo
convite à reflexão.
Para reviews de outros FILMES, clique aqui.
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