Diários de um Robô-Assassino, Livro 1 – Alerta Vermelho (Martha Wells)
“Um robô
construído para matar. Bem, construído com peças ruins e um sistema falho, mas,
ainda assim, criado para matar. Mas… e se ele quiser um pouco de paz? E se
preferir hackear o próprio sistema para assistir a uma infinidade de séries na
TV? Seria a melhor hora para que um grupo de humanos tirasse o pouco sossego
que ele conseguiu? Fariam, finalmente, com que o robô se importasse?”
(Sinopse disponível na contracapa do livro)
E se um robô
que foi construído para matar decidisse que quer passar o seu tempo
aproveitando as horas e horas de mídias que baixou do canal de entretenimento e
só quisesse ficar na sua, sem ser incomodado por ninguém? Talvez um dos motivos
pelos quais o livro caiu tanto no gosto do público seja justamente por quanto nos vemos no Robô-assassino. Escrito por
Martha Wells e publicado em maio de 2017, “Alerta
Vermelho” é o primeiro livro da série “Diários
de um Robô-Assassino”, que atualmente conta com sete livros e a confirmação
de um oitavo a ser lançado em 2026, e é uma obra de ficção científica que
ganhou prêmios como o Hugo, o Locus e o Nebula, além de uma adaptação pela
AppleTV+, que já está renovada para uma segunda temporada.
Ler ao livro
depois de já ter assistido à série é
uma experiência inusitada, porque faz muito tempo que eu não assisto a uma
adaptação que seja tão similar à obra na
qual se baseia, e meu principal pensamento no momento é que eu preciso
partir para “Condição Artificial”, o
segundo livro da série, para ter novidades e para saber o que acontece ao Robô
a partir do momento em que ele resolve escapar dos humanos que estavam
dispostos a levá-lo de volta para casa com eles… tudo é muito novo para o Robô
que hackeou o seu módulo regulador e é “forçado” a trabalhar com um grupo de
humanos para que não seja descoberto, e eu gosto de como o livro é sobre as descobertas que ele está fazendo, e não
me refiro à sabotagem e aos mistérios, mas aos sentimentos.
Será que ele
se importa mais do que quer admitir?
Martha Wells
conduz a narrativa em primeira pessoa com um tom quase ácido e indiferente, mas
nos diz o tempo todo que não podemos confiar plenamente no que o Robô está
dizendo, porque ele mais tenta não se
importar do que não se importa de
verdade. A escrita é fluída, rápida e extremamente bem-humorada, e eu gosto
dessa maneira de fazer ficção científica. Como eu já comentei tantas vezes aqui
no Parada Temporal, eu sou apaixonado pelo gênero… fiz minha dissertação de
mestrado a partir da leitura de uma obra de Philip K. Dick, por exemplo, e
considero “O Problema dos Três Corpos”
um dos melhores livros que li nos últimos anos, e “Alerta Vermelho” tem uma proposta diferente e acessível que deve
agradar a fãs e não-fãs do gênero.
O Robô
protagonista é designado a acompanhar uma equipe de cientistas, a
PreservaçãoAux, em uma missão com a qual ele não se importa de verdade, desde
que ele tenha tempo para assistir às suas séries enquanto os humanos fazem o
seu trabalho – ele não esperava ter que trabalhar tanto, no fim das contas.
Primeiro, é o ataque de um animal perigoso que não parece ter sido visto pelo
sistema; depois, sabotagens que incluem partes apagadas do mapa do planeta; e
as coisas se tornam crescentemente sinistras. Não há muito o que se fazer a não
ser investigar e tentar descobrir o que
está acontecendo… afinal de contas, alguém está por trás disso tudo, e
quando eles descobrem outra equipe, a DeltFall, assassinada, ele quer proteger os seus humanos.
Eu gosto de
como o livro é, em grande parte, sobre isso: sobre o Robô passando de “Eu não
me importo com nada disso e só quero assistir às minhas séries” para “Ninguém
toca nos meus humanos”. É gostoso
acompanhar essa transformação, até porque tudo é muito novo para todo mundo… aqueles humanos não
estão habituados a ter uma Unidade de Segurança e não o tratam como um
maquinário que deve ficar no departamento de carga, mas como mais um membro da
equipe; por outro lado, a Unidade de Segurança não está habituado a estar com
humanos com quem se importa de verdade, porque ele nunca conheceu humanos com
quem valesse a pena se importar. É uma surpresa até para ele mesmo o fato de
ele se importar tanto e não querer que nada de mal lhes aconteça!
A trama do
livro é conduzida de maneira ágil e com tons interessantes de mistério e de
ação. É um livro aventuresco que explora um planeta desconhecido e o que está
fazendo com que as coisas não saiam conforme o planejado, e o Robô-assassino
precisa usar um pouco do que ele assistiu nas incontáveis horas de séries de TV
que baixou para tentar lidar com GrayCris, um grupo ambicioso que está disposto
a tirar todo mundo do caminho seja como for para explorar o que descobriram no
planeta: restos alienígenas. Como o
planeta já abrigou uma civilização em algum momento do passado, ele não pode
mais ser explorado sem que as autoridades sejam informadas, mas é uma
oportunidade muito grande de ganhar
dinheiro que GrayCris não quer perder…
Mesmo que precisem matar para conseguir o
que querem.
O Robô é
imensamente mais altruísta do que ele quer que acreditemos que ele é. Durante o
livro, ele se afeiçoa aos membros da PreservaçãoAux como eles se afeiçoam a
ele, e destaco a relação dele com a Dra. Mensah, que ele eventualmente chama de
“minha humana favorita”, com o Ratthi, que pode ser o mais inconveniente do
grupo, mas, de alguma maneira, também o mais carismático, e com o Gurathin, com
quem ele troca farpas constantes e nunca estabelece uma relação de confiança de verdade. O Robô precisa
proteger essas pessoas, atrasar a GrayCris e encontrar uma maneira de enviar o
sinalizador para a empresa que pode enviar um resgate, e “está tudo bem” se ele
se colocar em risco no meio do processo… desde
que seus humanos estejam bem.
Infelizmente,
a empresa que tem todos os seus problemas, embora não estivesse por trás da
sabotagem nem nada, acaba saindo como a “heroína que salvou a equipe de
cientistas”, mas ao menos uma coisa boa vem disso tudo: toda a PreservaçãoAux
está bem, a vida do Robô foi salva e Ratthi lhe informa, quando desperta, que a
Dra. Mensah comprou o seu contrato permanente e ele pode ir para casa com eles…
esse momento é tão emocionante que eu não esperava que a conclusão do livro
fosse ter aquela virada, mas a entendo perfeitamente a partir do momento em que
a leio. A ideia de ir para casa com a Dra. Mensah e com os demais é boa: ela
não seria sua dona, mas sua guardiã,
e ele estaria livre em um lugar em paz para fazer o que ele gosta de fazer…
E descobrir o que ele gosta de fazer,
afinal!
Mas o Robô
não está preparado para isso… não ainda, pelo menos. Ele não quer que outras
pessoas tomem decisões por ele, mas isso é mais o que ele diz do que o que ele
sente: na verdade, ele está um pouco assustado com a perspectiva de viver com
humanos com quem se importa e que o tratam como igual, então ele resolve
escapar. É o medo que o faz agir nas últimas páginas do livro, e ele vai buscar
aventuras em algum lugar distante da Dra. Mensah e dos demais… e, quem sabe, se
meter em problemas. Sem sua armadura e passando tranquilamente por um humano
melhorado, o Robô rouba vestimentas, uma mochila e pega carona em uma nave
sabe-se lá para onde. Nesse momento, ele está saindo da Orla da Corporação…
Fora do
inventário e fora de vista.
O que o
espera por lá?
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