Guerreiras do K-Pop (KPop Demon Hunters, 2025)

“This is what it sounds like”

Com direção de Maggie Kang e Chris Appelhans, “Guerreiras do K-Pop” é uma das animações mais bem-sucedidas de 2025: lançada pela Netflix em 20 de junho, o filme conquistou público e crítica com uma história bem contada e músicas que ficaram em nossa cabeça durante semanas – “Meu pequeno guaraná!” –, e eu fico extremamente feliz com o sucesso de um filme que traz influências claras dos doramas em sua narrativa ou de animes em sua forma de animar e expressar emoções e reações das personagens, bem como elementos da cultura e do folclore coreano, tudo embalado por músicas do k-pop, um ritmo que conquistou o mundo nos últimos anos. É colorido, intenso, surpreendentemente emocional e, com toda a certeza, apaixonante do início ao fim.

“Guerreiras do K-Pop”, como o nome sugere, traz a história de três garotas que formam um grupo de k-pop, o Huntr/x, mas também precisam lidar com ameaças demoníacas e proteger o mundo de uma possível invasão do líder dos demônios, Gwi-Ma, que controla pessoas e outros demônios através do medo. Não é estranho para elas ter que enfrentar um grupo de demônios em um jatinho particular enquanto tentam manter-se alimentadas a 3 minutos de um show em um estádio cheio de fãs apaixonados com os depoimentos mais absurdos possíveis – absurdos exatamente como vemos na vida real, diga-se de passagem. Sua missão é manter fortalecido o Honmoon, uma espécie de proteção que mantém os demônios abaixo da superfície do nosso mundo.

Essa missão assumida pelas Huntr/x há alguns anos é passada de geração a geração: sempre existe um trio de caçadoras que enfrentam demônios e tocam as almas das pessoas através de suas vozes, e é isso o que dá poder ao Honmoon e enfraquece o Gwi-Ma. E, agora, elas estão prestes a tentar fazer o brilho tornar-se dourado, com o Honmoon atingindo seu poder máximo, eliminando os demônios de uma vez por todas. É assim que, no submundo dos demônios, surge um plano que pode funcionar: talvez eles precisem atacar justamente a maior força das caçadoras… e por que não através da música? Assim, para rivalizar com as Huntr/x, conhecemos os Saja Boys, uma boy band demoníaca formada por cinco homens bonitos que são, na verdade, demônios.

E fazer o quê se eles são mesmo cativantes?!

Com um súbito problema na voz de Rumi, a vocalista das Huntr/x, os Saja Boys invadem o mundo dos humanos no momento certo: eles podem roubar os fãs das Huntr/x e, consequentemente, enfraquecer o Honmoon, permitindo que cada vez mais demônios atravessem a barreira. Com um visual de deixar qualquer um babando e uma música-chiclete (e é chiclete, convenhamos!), os Saja Boys chamam a atenção, e as Huntr/x precisam encontrar uma maneira de eliminá-los – afinal de contas, elas percebem desde o Dia 1 que eles são demônios, por causa das marcas que trazem no rosto, ainda que elas estejam “escondidas” dos olhos não-treinados. Aquilo se torna uma batalha que não é só por números e por popularidade (a cena do programa de TV!), mas pelo mundo em si.

O filme é, no entanto, mais complexo do que a sua sinopse pode sugerir – e sua sinopse não podia entregar mais, na verdade, para que seja uma surpresa os temas dos quais trata. Rumi, a vocalista das Huntr/x, também tem marcas no corpo assim como os demônios que enfrenta: filha de uma caçadora com um demônio, Rumi sente que “é um erro desde que nasceu”, e foi sempre instruída a manter suas marcas escondidas, inclusive das melhores amigas… essas marcas estão avançando, no entanto, até atingirem a sua voz. O que atinge sua voz são as marcas em si, no entanto, ou o medo que ela sente de ser “descoberta”? Ela nunca permitiu que ninguém a visse como ela realmente é! E essa é uma característica que inusitadamente a aproxima de Jinu, o líder dos Saja Boys…

A relação de Rumi e Jinu acaba sendo um dos elementos mais interessantes de “Guerreiras do K-Pop”, porque um é sincero com o outro como não são com mais ninguém… Jinu sabe o segredo de Rumi que ela jamais teve coragem de compartilhar com ninguém, e acredita que esse segredo os torna iguais, embora Rumi insista que “não é como ele”. Jinu, por sua vez, conta sobre a sua vida como humano há mais de 400 anos e como se tornou um demônio aprisionado por Gwi-Ma, embora ele omita fatos… e são exatamente os fatos que ele omite que o tornam quem ele é. No fim, ambos buscam a mesma coisa: ELES QUEREM SER LIVRES. Rumi quer ser livre das mentiras e dos muros que ela mesma levantou… Jinu quer ser livre da culpa pelo que fizera no passado.

Embora Jinu vá mudando na companhia de Rumi, quase convencido de que ele pode ser diferente e de que ela o pode ajudar a ser livre, o poder de manipulação de Gwi-Ma é mais forte, e tudo culmina em um Idol Awards desastroso – o evento que deveria ser o momento anual de fortalecer o Honmoon e, quem sabe, conquistar o brilho dourado, acaba sendo o evento que enfraquece o Honmoon e libera demônios por todo o mundo. Rumi está arrasando no palco até ser enganada por demônios que seguem um plano de Jinu, e então tudo vem abaixo: ela canta a música que não queria cantar, porque não acha que é a mensagem que vai unir as pessoas, e suas marcas são expostas para todo mundo ver… agora, nem mesmo as amigas confiam nela, e talvez não pelas marcas propriamente ditas…

Mas porque ela escolheu nunca contar a verdade para elas.

Com a amizade enfraquecida e a mensagem de ódio se espalhando, Gwi-Ma parece ter vencido, e os Saja Boys anunciam um show à meia-noite que será um banquete de almas para o demônio – e cabe a Rumi deter aquilo tudo, e só existe uma maneira de fazer isso: sendo ela mesma. Rumi deixa de lado a vergonha que sentiu durante toda a vida e abraça suas marcas que fazem parte de quem ela é, e é uma música sobre aceitação e verdade que tem o poder que elas precisavam para expulsar Gwi-Ma de uma vez por todas. É uma sequência MARAVILHOSA que envolve ação, enquanto as caçadoras enfrentam demônios, e a união das vozes de todas as Huntr/x, que reata e fortalece a amizade delas… o sacrifício de Jinu, agradecido por ter “recuperado sua alma” e que agora a entrega a Rumi, também faz toda a diferença.

É forte o suficiente para mudar o mundo, e não com a Honmoon Dourada.

É uma Honmoon de diferentes cores… uma Honmoon que deixa a vergonha de lado, que não esconde.

Musicalmente, o filme se sobressai com uma trilha sonora apaixonante e uma qualidade técnica inegável. Os Saja Boys nos entregam músicas como “Soda Pop” (em português, “Meu Pequeno Guaraná”), que são propositalmente mais “vazias”, mas grudentas, enquanto as Huntr/x nos entregam canções bastante sentimentais e com letras excelentes, como “Golden”, que parecia ser a grande música do filme, e “What It Sounds Like”, que é a música que derrota o Gwi-Ma e protege o mundo com uma Honmoon nova e nunca antes vista, porque não é baseada em esconder quem você é, mas abraçar suas marcas que o tornam você. Também destaco “Free”, que é o dueto de Rumi e Jinu em um dos seus “encontros”, que é uma das minhas músicas favoritas no filme.

“Guerreiras do K-Pop” é um sucesso, e um sucesso MERECIDO, porque é uma animação não apenas competentíssima, mas cativante, com toda a sua junção de elementos que a tornam única e, com tamanho sucesso, eu duvido muito que não retornemos a esse universo no futuro, resta saber se será com uma sequência ou, quiçá, com spin-offs de outros trios de caçadoras através dos tempos… “Guerreiras do K-Pop” talvez seja um filme sobre o poder da música, talvez seja um filme sobre o poder da amizade, talvez seja ainda um filme sobre garotas duronas enfrentando demônios e protegendo o mundo, mas eu acho que ele é predominantemente um filme sobre marcas: todos têm suas marcas, mas não são elas que nos definem… não mais do que como as tratamos.

 

“I broke into a million pieces, and I can't go back
But now I'm seeing all the beauty in the broken glass
The scars are part of me, darkness and harmony
My voice without the lies, this is what it sounds like”

 

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