Anos Rebeldes – Pra não dizer que não falei das flores
“Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer”
João Alfredo
SEMPRE foi ativo na luta contra a Ditadura Militar… quando ele vê Maria Lúcia e
Carmem passando dificuldades financeiras por causa da morte de Orlando
Damasceno, ainda que elas não falem abertamente sobre isso, ele pensa em
arrumar um emprego para poder ajudá-las de alguma maneira… e é assim que ele
acaba trabalhando na portaria de um hotel e conseguindo dinheiro para comprar uma televisão nova para os Damasceno, já
que Carmem sempre gostou tanto de assistir a novelas, mas isso lhe garante
questionamentos a respeito de onde ele
está na luta contra a Ditadura. Ele é chamado por Sandra de “revolucionário
teórico”, porque está pensando mais nele mesmo e “na sua vidinha burguesa” do
que no que precisa ser feito nas ruas.
Tudo é muito
intenso e muito confuso nessa época. João Alfredo realmente quer ajudar a Maria Lúcia, mas ele também queria estar na
rua entregando jornais que denunciam os absurdos desse governo, e a própria
Maria Lúcia diz para ele que não quer que ele faça esses sacrifícios por ela –
e ele confessa que se sentiria melhor se estivesse mesmo entregando jornais.
Por isso, ele acaba abandonando o hotel. Quando eles saem juntos para entregar coisas naquela noite, no entanto, eles são
parados em uma blitz policial que é um dos momentos mais desesperadores que Maria Lúcia já enfrentou até ali, porque o
medo é uma constante nesse governo… me lembra muito a cena apresentada no
início de “Ainda Estou Aqui”, por
sinal.
Os
policiais, que há pouco tempo lançaram mais de 100 cavalos sobre estudantes e
todos os que estivessem na igreja prestando homenagem a Edson Luís, brutalmente
assassinado em um restaurante estudantil uma semana antes, agora param carros
na rua, se voltam contra qualquer estudante e os colocam contra a parede. João
Alfredo e Maria Lúcia escapam, dessa vez, por pura sorte… sorte porque Maria Lúcia
tem algumas provas de suas aulas particulares consigo e porque o João Alfredo
tem a sua carteira de trabalho que diz que ele está empregado em um hotel, e
isso é o suficiente para que eles não sejam vistos como revolucionários em
potencial… então, eles são liberados, mas o medo que eles sentiram ainda é
real.
E Maria
Lúcia está, novamente, cansada disso… ela está cansada de sentir medo o tempo
todo, de viver temendo que algo aconteça a João Alfredo, e ela também sabe que
ele não vai parar. As pessoas estão apanhando nas ruas, estão morrendo, estão
sendo perseguidas… e embora Maria Lúcia tema que algo assim aconteça a João
Alfredo, é justamente por isso que
ele ainda está lutando: para que não aconteça mais. Não tem como ser como o
Edgar, que tenta dizer a João que ele está errado e que “isso não é uma
guerra”, ou que “a grande maioria das pessoas estão vivendo uma vida normal”,
porque é justamente a inércia daqueles que ainda
(!) não se sentem afetados que permite que essas atrocidades avancem e ganhem cada
vez mais forças… até chegarmos ao AI-5.
Por alguns
dias, João Alfredo tenta levar uma outra vida… o que Edgar lhe dissera sobre
como “ele ainda vai acabar perdendo a Maria Lúcia por isso” ou que “ele pode ir
para o lado de lá a qualquer momento” lhe causa uma impressão, e ele não pode
dizer que não quer viver despreocupadamente ao lado de Maria Lúcia e se sentir
feliz… mas é impossível alienar-se a ponto de “se sentir feliz” quando tudo
aquilo está acontecendo e quando eles são lembrados disso o tempo todo. O Marcelo chega a perguntar a João Alfredo se é isso
mesmo o que ele quer, e João responde, com sinceridade, que ele queria que o
mundo fosse outro… mas diz, também, que ele descobriu que quer ser feliz.
Enquanto pode, João Alfredo tenta viver o seu pequeno e efêmero conto de fadas.
Enquanto
isso, acontece a PASSEATA DOS CEM MIL, no dia 26 de junho de 1968, uma passeata
organizada pelo movimento estudantil e que parte da Igreja da Candelária – o
mesmo lugar em que, quase três meses antes, estudantes foram agredidos por
policiais militares em um evento que nem
era um protesto. Após a passeata, qualquer manifestação pública é proibida,
e percebemos o avanço rápido da repressão, enquanto nos aproximamos dos
chamados ANOS DE CHUMBO. Heloísa e Olavo também brigam por esses mesmos
assuntos, porque Olavo é um conformado… não, mais do que isso: ele é um idiota
conservador, e Heloísa é uma revolucionária improvável que não quer ficar
quieta. Por isso, ela confessa que se casou com ele para sair da casa do pai, mas
que esperou que pudesse dar certo…
Não dá. Ela
não vai deixar de dizer o que pensa.
A escrita de
“Anos Rebeldes” é fenomenal. É,
provavelmente, um dos melhores exemplos de boa junção de História e ficção.
Gosto de como o avanço e a crueldade da Ditadura Militar não é um mero pano de
fundo quase esquecido, mas o fio condutor da narrativa, e de como o texto traz
informações de artistas, por exemplo, que estavam falando algo – e,
eventualmente, sofrendo represália por isso. Gosto muito da cena de Maria Lúcia
emocionada ouvindo ao disco de Gal Costa que João Alfredo comprara para ela, ou
a emoção e o fascínio gerado por Geraldo Vandré com o lançamento de “Pra não dizer que não falei das flores”,
porque eles ficam encantados com como ele consegue traduzir em poesia e música
exatamente o que eles estão sentindo.
É um símbolo
muito grande, é um combustível imprescindível para a luta.
Os militares
perseguiram cada um desses artistas por isso… porque sabiam a força que tinham!
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Cantinho de Luz

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