A Vida Secreta de Jonas (Luiz Galdino)

O diferente.

Escrito por Luiz Galdino, “A Vida Secreta de Jonas” é um livro brasileiro publicado pela Coleção Vaga-Lume em 1989, e é muito fácil de saber por que ele chama a minha atenção a partir do momento em que eu olho para a sua capa: a capa do livro traz um menino parado sob a luz de um disco voador; um possível visitante de outro planeta que acabou em uma cidadezinha brasileira, sem saber bem o que estava fazendo ali… com a linguagem característica da coleção, uma pitada de mistério e um interessante ensaio sobre como as pessoas tratam o diferente (que é o que de fato enriquece a experiência do livro), “A Vida Secreta de Jonas” é uma leitura deliciosa que se divide entre personagens que amamos e aqueles que amamos detestar…

O livro traz a história de um rapaz diferente que aparece sentado na praça da Serra do Mar no dia seguinte a uma experiência curiosa experimentada por Geninho e o pai, que viram um disco voador no quintal da própria casa. Silencioso e misterioso, o rapaz, que eventualmente recebe o nome de Jonas, chama a atenção dos outros adolescentes da cidade – alguns que estão fascinados e curiosos com o quanto ele parece não saber a respeito de si próprio; outros que parecem detestá-lo sem nenhum motivo aparente, além do fato de não saberem nada a seu respeito. Ana Paula e Geninho são os que mais se afeiçoam a Jonas e passam a protegê-lo; Rubão e Maurício são os que mais atormentam a vida do garoto; os demais, sinceramente, quase passam despercebidos.

Ainda que com poucas nuances e de maneira bastante literal, o livro trata de questões importantes como o fato de Jonas sofrer com o preconceito e as maldades de Rubão e Maurício, que detestam o garoto porque não o entendem, porque ele é diferente e porque eles acham que ele está roubando a atenção do grupo. Junta-se a isso a inocência de Jonas, que parece acreditar em tudo o que as pessoas dizem e não ver maldade nelas, e o resultado é quase desesperador, porque Jonas acaba se arriscando aceitando convites dos garotos, por exemplo, como da vez em que ele fica trancado em uma fábrica abandonada… e sabe-se lá como ele saiu de lá. E são justamente coisas que as pessoas não entendem que fazem com que Jonas gere ainda mais curiosidade.

Se alguns dos garotos estão detestando o Jonas, Ana Paula está bastante contente com o seu novo amigo, e ela e Geninho fazem de tudo para que Jonas fique bem… como ele não tem família e, possivelmente, nem onde dormir, Ana Paula acaba colocando na cabeça dos pais a ideia de levar o Jonas para morar com eles, e acaba ficando decidido que é isso o que vai acontecer, de maneira legal, até que os pais de Jonas apareçam novamente procurando por ele… se aparecerem. E é curioso ter Jonas morando na casa da família de Ana Paula, porque ele é claramente muito inteligente, mas, ao mesmo tempo, ele faz perguntas muito simples, parecendo que nunca viu na vida coisas que são rotineiras, aumentando a ideia de “um garoto de outro mundo”.

A amnésia, o desconhecido, o jeito “estranho”.

Jonas é acolhido na casa de Ana Paula como parte da família, e ela e Geninho se tornam grandes amigos do novo morador do bairro, mas alguns comentários maldosos e calculados no bairro se espalham e acabam por causar medo – e, assim, as pessoas vão gradativamente se voltando contra o Jonas. As pessoas são suscetíveis o suficiente para acreditar em qualquer coisa! Quando Fox, o cachorro do Rubão, desaparece, ele acredita que Jonas é o responsável, e ele tenta vender a ideia de que “ontem foi um cachorro e amanhã pode ser um deles”. Essa narrativa ganha força na cidade, com poucos defensores de Jonas que continuam confiantes em sua inocência… e logo os comentários evoluem para dizer que “Jonas é alguém de outro planeta”.

O livro tem a sua parcela de ação muito gostosa de se ler, com direito a um acampamento, por exemplo, um acidente que quase custa a vida de Ana Paula, mas conta com um ato heroico de Jonas, e uma horda de repórteres que querem entrevistar Jonas e querem descobrir se ele é, de fato, um ser extraterrestre. Jonas passa por maus-bocados na Serra do Mar (é espancado por pessoas furiosas, tem a casa sitiada, se sente culpado por “trazer tanta confusão” para a família de Ana Paula), e tudo isso no meio de um pânico que toma conta das redondezas graças a matérias de jornal que anunciam que “objetos voadores não identificados foram vistos sobrevoando as torres de alta tensão” e que “os marcianos chegaram”… com o nome de Jonas no meio!

Eventualmente, Jonas consegue “provar” que ele é apenas um humano comum com problemas de amnésia, e quando a cidade finalmente começa a se redimir com ele porque ele ajudou a salvar a vida de Ana Paula e provou que não é uma ameaça, como todos estavam pensando, ele é informado de que seus pais estão vindo buscá-lo. Gosto de como “A Vida Secreta de Jonas” deixa aquele gostinho de dúvida no ar… ainda que haja a sugestão de que Jonas era humano, no fim das contas, a capa, os acontecimentos e, especialmente, a maneira como o Jonas vai embora, “desaparecendo”, não deixam dúvidas: ele realmente era um visitante de outro planeta. O que ele buscava e que tipo de informação ele levará, aí cabe a cada um.

Acho que, de modo geral, “A Vida Secreta de Jonas” é um livro sobre o diferente. Eu gosto bastante da temática que envolve espaço ou vida extraterrestre, mas o livro é muito mais sobre a Terra e sobre os humanos do que sobre o desconhecido do universo. Jonas, possivelmente um alienígena “deixado” na Terra por um período de tempo, é apenas o mote em torno do qual a história se desenvolve, e a história é guiada pelas ações e pelas reações das pessoas quando se encontram com o dito “diferente”. No fim, a humanidade se divide não apenas entre “Anas Paulas” e “Rubões”, mas também em “Rafas”, em “Cláudias”, em “Geninhos”… e, é claro, em “Jonas”. Um livro muito bacana de Luiz Galdino, certamente vale a leitura!

 

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