Depois do Universo (2022)

Copo meio cheio.

De tempos em tempos, ganhamos um romance jovem, intenso e dramático que arrebata a audiência e se torna um fenômeno, deixando o espectador encantado, apaixonado, mas também com lágrimas nos olhos. É o gênero do qual “Um Amor Para Recordar”, “A Culpa é das Estrelas” e “A Cinco Passos de Você” faz parte, para citar alguns romances nos quais uma doença grave faz parte da trama central – e eu talvez incluiria o belíssimo e tocante “Meu Primeiro Amor” nessa lista, e até o clássico shakespeariano “Romeu e Julieta”, que talvez tenha sido um dos primeiros exemplares dessa ideia de amor trágico, embora lá fosse mais pelo amor proibido do que pelo “amor com dias contados”, como nos primeiros exemplos que citei. E com uma doença autoimune desempenhando um grande papel no roteiro de “Depois do Universo”, o filme é um desses romances arrebatadores e melancólicos.

Lançado em outubro de 2022 na Netflix, e protagonizado por Giulia Be e Henrique Zaga, “Depois do Universo” é um filme brasileiro apaixonante – com o toque certo de romance e drama, o filme acompanha a história de amor de Nina e Gabriel, enquanto ela espera por um transplante de rim e ele compromete sua carreira ao quebrar as regras da relação entre médico e paciente… gosto do fato de “Depois do Universo” não ser um filme adolescente, e trazer protagonistas cujos sonhos e ambições vão além daquela fase escolar. Nina trabalha em um conservatório, mas sonha em ser pianista da Orquestra Sinfônica, mesmo que a carreira como pianista seja difícil com as dores causadas pelo lúpus; Gabriel, por sua vez, é médico residente em um hospital, e tem uma visão um pouco diferente do que ele pode fazer pelos pacientes, tornando seus dias mais felizes.

Consigo me apaixonar por ambos os protagonistas em questão de minutos… os dois se encontram pela primeira vez na Estação da Luz, enquanto Nina está tocando piano, absorta em seu próprio mundo, e Gabriel fica tão fascinado por aquela garota que acaba batendo no piano, depois de ter invadido a estação de bicicleta, mesmo que fosse proibido – aquela é uma primeira impressão forte, positiva ou não, e é um grande prazer quando Nina chega no hospital para uma consulta, porque vai começar um tratamento, e Gabriel é o médico que a atende… então, sorrimos e esperamos pelo desenvolvimento desse romance. “Depois do Universo” é um daqueles filmes que você assiste sabendo que um final trágico te aguarda, mas você quer fingir que isso não vai acontecer e tenta ao máximo postergar esse sofrimento até que ele seja inevitável.

Até lá, só queremos curtir esse momento.

E é uma construção muito bonita do romance dos dois. Os dois são bastante diferentes, ela um copo meio vazio e ele um copo meio cheio, mas também são complementares – ou, como Nina diz, “compatíveis”, porque “ser compatível” não tem a ver com ser igual… tem a ver com esse encontro de almas, com essa sensação boa de que, de repente, as coisas são melhores, que as coisas fazem mais sentido. Acho que Gabriel se apaixonou primeiro, porque ele ficou 100% encantado desde que a ouvir tocar piano pela primeira vez, mas Nina não pôde resistir a ele… ele colocou um sorriso no seu rosto, ele tornou seus dias mais significativos, e eu a entendo perfeitamente: era praticamente impossível não se apaixonar por um homem como Gabriel, que é lindo, educado, gentil, atencioso, divertido… ela nem queria se apaixonar, mas ele não lhe deixou escolha.

Eu também me apaixonaria por Gabriel.

Todas as cenas de Gabriel e Nina são bonitas e esbanjam química – e torcemos por eles mesmo sabendo das complicações nas quais ele pode se meter porque, como médico de Nina, ele não poderia se envolver com ela… e ele até sabe disso, ele até recusa um convite para um almoço um dia, mas é em vão, porque quando eles percebem já é tarde demais para impedir o sentimento. Ele já está levando ela de bicicleta para fazer a inscrição para a audição para a Orquestra Sinfônica, ou encontrando um piano na capela abandonada do hospital, onde Nina pode ensaiar depois de ter perdido o emprego no conservatório, e a parceria deles é tão bonita que Gabriel acredita que valeria a pena ser afastado do hospital e ter que recomeçar, se realmente chegasse a isso. O que importava era que ele estava feliz, e que Nina também estava feliz.

Preciso, ainda, destacar a relação de Gabriel com Yuri, seu melhor amigo e colega de quarto, interpretado por Leo Bahia. Yuri é um dos melhores personagens de “Depois do Universo” e rouba a cena sempre que aparece, e eu tinha certeza de que seria assim desde as suas primeiras falas, quando ele fala sobre “estar conversando com seu marido, com quem acabou de dar match”. A parceria cheia de amor que existe entre Gabriel e Yuri é tão bonita e tão sincera que rende vários dos melhores momentos do filme, e é muito bonito como ambos estão lá um pelo outro quando o outro precisa… Yuri está lá para cobrir plantões, para ajudar nos planos de Gabriel ou para cozinhar no seu lugar quando ele chama Nina para jantar, mas Gabriel também está lá para consolar o amigo quando ele sofre mais uma desilusão amorosa por causa de um boy lixo.

Tão fofos!

Nina e Gabriel vivem um romance honesto e entregue no tempo em que podem estar juntos… ela até tenta abrir mão dele, para não prejudicá-lo, mas recebe um chamado que lhe diz que ela não pode ter medo – e não pode deixar de viver porque acha que vai morrer, o que pode acontecer em 6 meses ou em 30 anos… e, bem, qual de nós sabe quando essa hora vai chegar? Então, ela arrisca tudo, faz um grande gesto, que, no seu caso, é um discurso ao comitê que está julgando o caso de Gabriel, e os dois são liberados para viver esse romance, até porque ele sempre foi um excelente profissional e todos os pacientes do hospital estariam perdendo muito se ele não estivesse mais ali… adoro a sequência na qual ele prepara um show para ela tocar piano na capela, com direito a decoração, plateia e uma segunda chance na Orquestra Sinfônica; emocionante!

E, então, precisamos enfrentar o momento fatídico – o momento que no fundo todos sabíamos que estava por vir. Eu curti aquele clímax, aquela resolução, aquele espírito de romance e de esperança… mas eu precisei verificar quantos minutos de filme faltavam, e quando eu percebi que faltava, ainda, aproximadamente meia-hora, eu soube que um deles ia morrer – e que provavelmente seria ele, porque era quem não estávamos esperando que morresse. Gabriel morre ao sofrer um acidente em uma montanha que ele visitava todo ano no aniversário da mãe, porque era o lugar ao qual costumava ir com ela, e um lugar aonde um dia ele ainda queria levar Nina, quando ela tivesse recebido um transplante de rim e estivesse bem… agora, ele nunca terá a chance de acompanhá-la até lá, e toda a sequência de sua morte/velório foi tristíssima.

Mas, inusitadamente, “Depois do Universo” tem uma mensagem bonita e uma mensagem de esperança e vida, apesar do sofrimento. Acaba sendo triste e melancólico, mas ainda que Gabriel não esteja mais ali, ele ensinou Nina a “ver o copo meio cheio”. É muito bonito ver a Nina conversando com o pai de Gabriel após a morte dele, tendo ela ajudado na relação dos dois, de algum modo, assim como é lindo ver que ela teve coragem de ir sozinha à montanha depois do transplante, porque aquele era um lugar no qual ela se sentiria próxima a Gabriel… ela também realiza o seu sonho, se torna parte da Orquestra Sinfônica, se apresentando em homenagem a ele, e vemos que ela voltou a viver, olhando para a vida com uma pitada de otimismo que ela não tinha, mas que Gabriel a ajudara a descobrir… é triste e arrebatador, mas também é belo e emocionante.

Lindo. Adorei!

Aquela breve cena de Gabriel ao lado de Nina no topo da montanha é de arrepiar.

 

Para reviews de outros FILMES, clique aqui.

 

Comentários