Anos Rebeldes (1992)

“Caminhando contra o vento / Sem lenço, sem documento”

Uma das melhores minisséries da televisão brasileira! Escrita por Gilberto Braga e dirigida por Dennis Carvalho, “Anos Rebeldes” foi uma produção exibida entre 14 de julho e 14 de agosto de 1992, em 20 capítulos. Embora “Anos Dourados”, exibida em 1986, tivesse um fundo discretamente político e tenha tido um epílogo que abordou rapidamente temas referentes à época da Ditadura Militar, percebe-se um salto imenso de “Anos Dourados” para “Anos Rebeldes”. Não se trata de uma sequência e as propostas das duas minisséries são bem distintas, cada uma extremamente competente dentro daquilo a que se propôs, mas eu dedico o meu amor a “Anos Rebeldes”: é uma jornada eletrizante, desesperadora e ainda muito necessária.

Como o título sugere, “Anos Rebeldes” se volta aos anos da Ditadura Militar no Brasil, e a melhor parte, para mim, é o fato de essa temática política não ser tratada como “pano de fundo” da narrativa: a vida dos personagens é definida e constantemente afetada por tudo o que está acontecendo no país… o golpe militar, o silenciamento de vozes dissonantes, prisões e torturas, e enquanto a direita avança desenfreadamente e suprime direitos, a resistência tenta se manter firme, tenta fazer algo – até mesmo quando a luta é claramente desigual e eles precisam trabalhar mais na contenção de danos, conseguindo a liberdade de companheiros que foram presos e estão sendo torturados, do que de fato no avanço de uma revolução contra a Ditadura.

A experiência de assistir a “Anos Rebeldes” atualmente é curiosa… e triste. Acontece que a narrativa ainda é muito presente. Com o sucesso recente de “Ainda Estou Aqui”, que nos garantiu um Globo de Ouro para Fernanda Torres e um Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, fomos convidados a olhar para essa mancha de nosso passado e recordar a fala de Eunice Paiva sobre não esquecer – a ideia de que precisamos contar essas histórias e lançar esse olhar sobre o passado é determinante para o sucesso duradouro de “Anos Rebeldes”, que parece tão atual agora quanto quando foi exibida pela primeira vez em 1992. Trata-se de um texto com uma força indiscutível, que retrata de maneira destemida essa época e a deixa no centro da narrativa.

É nesse cenário politicamente caótico que conhecemos João Alfredo e Maria Lúcia, o casal protagonista de “Anos Rebeldes”, cujo romance e vida são marcados por posicionamentos que divergem – não necessariamente em termos de “ideais”, mas em termos de “reações”. De um lado, temos João Alfredo, um jovem revolucionário a quem importa mais a luta do que qualquer outra coisa, e é por isso que ele conhece Maria Lúcia para início de conversa, porque ele está atrás de seu pai, um notável jornalista de esquerda, para uma palestra; de outro, temos Maria Lúcia, uma jovem que acredita que o que quer que esteja acontecendo fora do seu alcance não lhe diz respeito, e ela quer fechar-se em seu mundinho sem precisar, de fato, fazer algo.

Ela quer fingir que “não é com ela”.

A minissérie é dividida em três momentos históricos. Começamos a história nos chamados ANOS INOCENTES, onde conhecemos os personagens principais no final dos seus anos escolares, enquanto os movimentos de avanço da direita são claros e os boatos da tentativa de derrubar Jango se concretizam em 1964, quando a Ditadura Militar é instaurada no Brasil. Durante os primeiros anos, com muita coisa acontecendo sob os panos, muitas pessoas tentaram fingir que a situação não era desesperadora. Essa época levou aos chamados ANOS REBELDES, que contaram com a intensificação da ditadura e da repressão, e essa época contou com eventos como o assassinato a sangue frio de Edson Luís, um estudante, que deu início a uma série de eventos de ambos os lados…

Com a revolução ganhando força e a marcha que partia da Igreja da Candelária conseguindo cem mil participantes, toda manifestação foi expressamente proibida, e com a aprovação do Ato Institucional Nº 5 em 1968, deu-se início aos chamados ANOS DE CHUMBO. Aqui, as coisas saíram de controle… superpoderes foram dados ao presidente, direitos foram cancelados, a tortura foi permitida. Muita prisão, muito sangue, muita negação das torturas e assassinatos cometidos pelo governo… e é nesse momento que a luta armada acaba ganhando força contra a Ditadura Militar, e vemos personagens de “Anos Rebeldes” indo para a clandestinidade, onde sua principal missão é resgatar presos políticos… com meios não necessariamente ideais, mas necessários.

Era a única forma de lutar.

Com sensibilidade e realidade, “Anos Rebeldes” nos conduz pela história desses personagens e desses anos conturbados da História do Brasil, retratando eventos históricos em uma mistura deliciosa e competente de realidade e ficção que nos convida a lançar um olhar crítico sobre isso tudo… continuamente nos instigando a pensar. Durante muito tempo, pensar e fazer perguntas foi considerado “errado”, pessoas foram perseguidas, torturadas e mortas por isso, e ainda hoje precisamos registrar esse tipo de história para que que elas não voltem a acontecer, especialmente em tempos em que a direita avança perigosamente, espalhando negacionismo, conservadorismo, preconceito. “Anos Rebeldes” é uma daquelas obras ESSENCIAIS.

Tão importante agora quanto sempre!

 

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