Vale o Piloto? – The Young Pope 1x01


“What have we forgot? We have forgotten you”
Uma série forte, surpreendente, com uma fotografia belíssima que vem com propriedade na intenção de quebrar barreiras, expor verdades e levantar questionamentos. Eu vi por acaso, resolvi conferir e, portanto, eu não sabia direito o que esperar. Pouco antes de começar o episódio, no entanto, eu pesquisei para notar que Pio XIII, o papa interpretado por Jude Law, é um papa fictício. E ele, com uma intensidade impressionante, certamente redefine os padrões da Igreja Católica e promete um papado polêmico de tentativas de transformações que serão, inevitavelmente, podadas, na construção de uma verdadeira guerra que se anuncia. É minha primeira impressão, na verdade. Confesso que meus sentimentos em relação ao episódio foram conflitantes. Eu estava adorando tudo. A postura de Lenny Belardo ao se tornar o mais novo Papa Pio XIII, e tudo o de novo que ele representava, por mais controverso que pudesse ser, ocasionalmente. Há um divertido tom blasfemo escondido sob acusações embasadas e uma construção séria no estilo de narrativa que quer te fazer acreditar naquilo tudo, tornar tudo possível dentro do universo a que se propõe construir. É fascinante e chocante, simultaneamente.
O tom da série é perfeitamente definido desde suas primeiras cenas. Os bebês e aquela montanha sob a qual Pio XIII sai é deveras desconcertante, e tem a clara intenção de não significar nada até que você pare e a analise com calma. A cena seguinte é mais clara, igualmente desconcertante. Toda a caminhada de Pio XIII rumo à sua primeira homilia, os olhares admirados de toda uma sociedade dentro da Igreja e de todo um grupo de fiéis que aguardam ansiosamente na Praça de São Pedro, no Vaticano, para ouvir o que o novo Papa tem a dizer. Chega a arrepiar! Muito calmamente, em tom quase sombrio, as coisas se organizam introspectivamente, até que Pio XIII chegue ao microfone. E comece a falar. E da maneira mais revolucionária possível, ele começa a dizer verdades. Quando ele diz “We have forgotten to be happy” e que a única maneira de ser feliz é através da liberdade, eu não pude deixar de concordar. É extremamente estranho, pelo deslocamento do vocabulário esperado de um religioso, ouvir um Papa falar sobre masturbação, mas é reconfortante ouvi-lo falar sobre casamento gay, por exemplo, e um conjunto de outras verdades esquecidas pela Igreja Católica.
E que não são, de fato, esquecidas.
Apenas ignoradas.
De todo modo, a sequência é, sim, chocante. Eu confesso que, embora adorando tudo o que Pio XIII disse, me faltou o ar. Me faltou o ar de verdade. Foi quase reconfortante que fosse tudo um sonho. E naqueles primeiros 10 minutos, a série conseguiu, de forma genial, apresentar seu tom, sua intenção e a personalidade de Lenny Belardo, que acaba de se tornar Pio XIII, o mais novo Papa. “I am the Pope”. Com a Praça de São Pedro vazia, novamente deixando sua cama, tentando se adaptar à sua nova “identidade”. Ser o novo Papa deve mesmo ser extremamente confuso. A série reproduz isso quando o Papa pede uma Coca Zero de Cereja e fala do sonho do discurso e dos cardeais se estapeando. As cenas, nos mesmos cenários da realidade e nada que indique sonho além da narração de Pio XIII são desconcertantes. Esse é Lenny Belardo, isso que conhecemos no sonho, aquilo é tudo o que ele queria fazer, mas certamente não pode. Suas tentativas de revolucionar o Vaticano serão fabulosas de se assistir, e arriscadíssimas. Ele ainda está tentando se adaptar à realidade de sua nova posição.
“From now on you’re Pius XIII, Father and Mother of the entire Catholic church”
A construção da nova imagem de Papa se dá em um conjunto de cenas, como Pio XIII fumando, ou sua confissão na qual ele afirma que sua consciência não lhe acusa de nenhum pecado – não significa que ele não possua nenhum, só que não se arrependa de nada. É uma postura interessante e inovadora. A presença de sua “mãe” na forma da Irmã Mary também é importantíssima para sua construção, tanto no flashback de quando ele tinha 7 anos e chegou ao Orfanato quanto agora, quando ela aparece, cheia de orgulho e felicidade, e ele a coloca em uma posição importantíssima, negando qualquer tradição que tentam lhe impor. Adorei como ele bate de frente com Voiello, a imagem revoltante da política e do controle atrás de tudo. Sua atitude com ele é fenomenal, embora também igualmente revoltante, mas eu adoro a sua reflexão sobre o passado, eu adoro como ele coloca a Irmã Mary para supervisionar TODAS suas ações (especialmente aquela fala do “Todos nós precisamos de Anjos da Guarda, Voiello. Especialmente homens ambíguos e inescrupulosos”, que é bastante arriscada).
Parece, sim, que haverá uma verdadeira guerra. A série me parece uma forma talvez meio exagerada e caricaturada (na esperança de se “afastar” da realidade ao mesmo tempo em que ironicamente se aproxima dela) de criticar a resistência em relação ao diferente e, especialmente, à mudança, no conservadorismo atual. Eu só conseguia pensar no quanto Pio XIII, na vida real, seria assassinado para que alguém mais dentro dos “padrões” a alienado pudesse assumir o papado. Voiello realmente está em uma missão parecida, encomendando a investigação minuciosa do passado de Lenny Belardo, para que toda informação possa ser usada em caso de necessidade. Não que o próprio Lenny, ou Pio XIII, não esteja fazendo suas próprias investidas, conseguindo que o padre que atende as confissões do Vaticano lhe conte segredos em frente à “Casa de Deus”. E aquela cena final é profundamente angustiante e repleta de tensão quando o Papa Pio XIII confessa: “I’m saying that I don’t believe in God, Tommaso” com tanta seriedade. Independente de ele desmentir ou não, nós sabemos o que significa.
Mas ninguém no Vaticano está preparado para ouvir isso.
Ainda mais do Papa!

Para mais Pilotos de série, Vale o Piloto.


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