Encanto (2021)

“Welcome to the Family Madrigal!”

A ENCANTADORA HISTÓRIA DA FAMÍLIA MADRIGAL E TODA A SUA MAGIA. “Encanto” é a mais nova animação musical da Disney (com músicas de Lin-Manuel Miranda), uma animação doce, colorida e bela, de uma família latina que mora nas montanhas da Colômbia. Há muitos anos, a Família Madrigal estava escapando de perseguidores quando perdeu um de seus membros e recebeu um milagre: uma vela representando a magia da família, que afastou os perseguidores, protegeu a família e lhes deu uma Casita na qual morar… agora, a Família Madrigal é uma família cheia de “dons”: poderes mágicos que recebem na infância e que eles usam para ajudar o vilarejo que se ergueu ao redor da Casita da Família Madrigal nos últimos 50 anos – Encanto. O problema, é claro, é que alguma coisa parece estar errada com a magia da família, e apenas Mirabel Madrigal pode ajudá-los.

Mirabel é a mais diferente dos Madrigal – por algum motivo, ela não recebeu dom nenhum quando chegou a sua vez, e ela é o primeiro membro da família sem poderes… suas irmãs, por exemplo, têm seus dons: uma pode levantar qualquer peso, enquanto a outra pode fazer todo tipo de flor florescer ao seu redor; a mãe consegue curar qualquer coisa com as coisas que cozinha; uma das tias tem uma super audição e a outra controla o tempo, embora de uma maneira bem limitada… um dos seus primos tem a capacidade de se transformar em outras pessoas. Mirabel é a única Madrigal que não recebeu um dom. Quando chegou a sua vez, a vela pareceu falhar, a porta que deveria dar para o seu quarto mágico que teria tudo a ver com seu dom simplesmente desapareceu, e, desde então, Mirabel é excluída quase como se não fosse parte da família.

Confesso que eu sofri bastante por Mirabel durante todo o filme – ela é tratada como diferente, constantemente relembrada disso e menosprezada, acusada de uma série de coisas, hostilizada, e ela ainda pede desculpas quando alguma coisa dá errado, como se ela tivesse a culpa. Com toda aquela fachada mágica, colorida e benevolente, a verdade é que a Família Madrigal pode ser bastante tóxica. E novamente eu me lembrei de algo que eu sempre comento: eu não poderia ser o protagonista desses filmes mesmo porque, no lugar de Mirabel, eu estaria pouco me lixando praquela família maldosa, especialmente para a avó, que acha que tudo o que acontece de ruim é culpa dela… vide toda a sequência da cerimônia de dom do Antônio, que é um momento difícil e sofrido para Mirabel, mas ela está lá porque o primo a quer ao seu lado, e toda a família observa segurando a respiração.

Antônio também ganha seu dom, o de falar com os animais, e um quarto incrível (“It’s bigger on the inside!” foi uma referência CLARÍSSIMA a “Doctor Who” e eu dei uma pequena surtada ao ouvi-la, preciso dizer!), deixando Mirabel como a única Madrigal sem dons mesmo… mas ela também é a única Madrigal que parece estar vendo a ameaça à magia, e talvez seja a única que possa salvá-la. Durante a festa que se segue ao recebimento do dom de Antônio, Mirabel vê rachaduras se espalharem por toda a casa e ameaçarem a vela que é a magia da família, mas quando ela corre para pedir a ajuda da Abuela e de todos os demais, as rachaduras simplesmente desaparecem, como se elas nunca tivessem estado ali, e ninguém lhe dá muita atenção… mas ela sabe o que viu, e não vai descansar enquanto não descobrir o que está acontecendo.

Assim, Mirabel se vê em uma missão em busca de respostas, e ela tem cenas bem interessantes e que mostram o quanto ela se importa – embora por que ela se importa me parece um grande mistério… eu não a julgaria se ela tivesse crescido amargurada e subitamente feliz porque a magia dos demais estava ameaçada, não depois de como ela foi tratada por tantos anos, e como está sendo tratada agora, como se “ela estivesse estragando tudo”. Em uma conversa com Luísa, sua irmã mais velha e que tem super-força, começamos a entender o que está de errado com a Família Madrigal, e acho que Luísa ganha uma das canções mais poderosas do filme: aqui, ela fala sobre como ela trabalha incessantemente para todo o vilarejo por causa de sua força, e de como as pessoas não veem nela nada além de sua força, mas “ela é muito mais do que o seu dom”.

Esse é o grande problema

Luísa é quem direciona Mirabel, e a envia para a Torre do Bruno, um tio sobre o qual eles não falam (“Silenzio, Bruno!” Pera, filme errado), que foi embora há muitos anos… é engraçado e irônico como o filme nos leva a acreditar que o Tio Bruno é um vilão, quando na verdade ele foi apenas mais uma vítima da Família Madrigal, assim como a própria Mirabel: seu dom era o de ter visões, e então todo mundo se voltou contra ele como se ele fosse a causa das coisas ruins que aconteciam, com a Abuela sempre esperando e vendo o pior dele… dentro da Torre de Bruno, Mirabel encontra uma visão dele que tem a ver com ela, e a leva para fora, o que coloca toda a família em estado de pânico – na verdade, quando finalmente conhecemos o Bruno, ele não é o vilão pintado, mas um cara bom, sozinho e infeliz, que continua morando na Casita, escondido.

Bruno é, talvez, o melhor plot twist de “Encanto” e, assim como acontece com Mirabel, eu sofro por ele: ele também foi maltratado e hostilizado pela família a ponto de escolher ir embora, acreditando nas coisas que lhe diziam, e agora ele se sente mal, como se fosse o responsável pelo sofrimento dos Madrigal, mas fica escondido na casa, assistindo a tudo, ainda dizendo que “os ama” – é definitivamente um relacionamento abusivo da avó com todas essas pessoas. Bruno foi embora por escolha própria assim que teve a visão da casa se rachando e a Mirabel em frente a ela, porque ele sabia o que pensariam se vissem sua visão, então ele escolheu protegê-la… e, agora, ele escolhe ajudá-la. Mirabel e Bruno são a melhor dupla de “Encanto”, e entregam alguns momentos muito bonitos, como quando ele volta a se esconder e ela promete que vai voltar para trazê-lo de volta.

Quando Mirabel incentiva Bruno a ter uma nova visão, ele a vê abraçando alguém, e Mirabel fica com a impressão errônea de que “ela precisa dar um abraço na irmã” e isso vai salvar a magia, mas sem entender qual o significado do abraço. Mesmo assim, o fato de Mirabel achar que tem que abraçar Isabela, a irmã com quem nunca se deu bem porque ela é “perfeita”, a faz se aproximar da irmã, que ganha uma música quase tão poderosa quanto a de Luísa, na qual ela fala algo parecido com o que a irmã dissera: tudo o que se espera dela, toda a pressão que a família faz para que ela seja sempre “perfeita”, e como ela não é feliz. Quando Isabela se solta e faz o que quer, deixando a imagem “perfeitinha” de lado, a magia da Família Madrigal se torna mais forte. Quando a Abuela aparece gritando e acusando Mirabel de arruinar tudo só porque não tem dons (!), a chama oscila e as rachaduras retornam.

ADORO como Mirabel não fica calada e diz à avó tudo o que agora sabe: a culpa é DA AVÓ!

É a Abuela quem está comprometendo a magia da família… o que está acabando com a Família Madrigal não é, nem de longe, nada que a Mirabel esteja fazendo, mas o fato de que eles estão infelizes com os seus dons… eles estão cansados de serem vistos apenas como “dons”, apenas como mão-de-obra, e não como pessoas; e a Abuela continua os pressionando e os pressionando. Então, durante a discussão de Mirabel e Alma (AMEI A MIRABEL DIZENDO TUDO NA CARA DA ABUELA!), o caos reina, a Casita se destrói e Mirabel faz de tudo para resgatar a vela, que está queimando e se desfazendo, e ela a pega, no fim das contas, mas a chama logo se apaga e toda a magia vai embora… agora, enquanto Mirabel chora na beira do rio em que a família recebeu seu milagre, quem tem que perceber o que estava errado e fazer algo a respeito não é ela.

É a Abuela Alma.

No fim, o abraço que importava era o de Mirabel e Alma, e quem tinha que ver seus erros e aprender com eles não era Mirabel, mas a avó em toda sua obsessão gerada pelo medo de perder o seu milagre. Ela precisa ver que o milagre não são os poderes… é a família, é cada um deles. Então, temos uma sequência final bem bonitinha em que Mirabel lidera o retorno da família à Casita destruída e, com a ajuda do povo do vilarejo, eles a reconstroem sem magia, que só retorna quando Mirabel coloca a maçaneta na porta. Mirabel não tinha dons, como a Abuela também não tinha, porque ela seria a nova portadora do milagre, por assim dizer… sinceramente, eu esperava que, no fim, a magia não retornasse, porque eu temo que os Madrigal vão se perder novamente e todos os problemas vão retornar… mas espero que não; talvez a Abuela tenha de fato aprendido e não vá mais pressioná-los tanto, e então eles poderão ser quem são e ser felizes.

Finalmente entendendo o que é o verdadeiro dom: a família e o amor.

 

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