Desventuras em Série, Livro Undécimo – A Gruta Gorgônea



Navegando em águas não cartografadas…
Esse é UM DOS MEUS LIVROS FAVORITOS em “Desventuras em Série”. As crianças Baudelaire estão explorando um pouco mais da organização de que agora fazem parte (Lemony Snicket já os chama oficialmente de “voluntários”), enquanto se veem em um submarino em busca do açucareiro que contém um importante segredo de C.S.C. A força do livro está no fato de a trama estar ficando mais complexa, e de Lemony Snicket estar dando algumas poucas respostas, enquanto nos enche de novas dúvidas, ampliando o seu universo de maneira astuta, sempre prendendo nossa atenção através da curiosidade… e as crianças estão cada vez maiores, mais independentes, e nós vemos como isso as torna distintas daquelas crianças que começaram o “Mau Começo”, na Praia de Sal, em seu primeiro encontro com o Sr. Poe e sua tosse infindável… agora, um ciclo chega ao fim.
E estamos pertíssimo do final!

Caro Leitor,

A menos que você seja uma lesma, uma anêmona-do-mar ou um fungo, provavelmente prefere não ficar úmido. Também pode ser que prefira não ler este livro, em que os irmãos Baudelaire descem para as profundezas do desespero subaquático, onde encontram bastante umidade.
Os horrores com que eles se deparam lá embaixo são tantos e tão horríveis – como uma busca desesperada por algo perdido, um monstro mecânico, cogumelos, uma perturbadora mensagem de um amigo desaparecido e uma apresentação de sapateado – que é impossível enumerar ou sequer mencionar.
Como autor dedicado que jurou registrar a deprimente história dos Baudelaire, preciso continuar me aprofundando profundamente nas profundezas cavernosas das vidas dos órfãos. Mas você pode se aprofundar na leitura de um livro mais alegre e evitar que seus olhos e seu humor se afoguem.

Respeitosamente,
Lemony Snicket

Amigo ou inimigo?
As crianças estão à deriva no Arroio Enamorado, cada vez mais longe de Quigley Quagmire, quando veem um periscópio com o olho que é o símbolo de C.S.C.: um submarino pode ser a única maneira de eles saírem daquelas correntezas geladas vivos. Então, torcendo para que o submarino esteja do lado certo da cisão, eles batem na escotilha e entram, arriscando tudo, quando escutam um “Entrem, jovens Baudelaire”. Do lado de dentro do Queequeg, encontram o Capitão Andarré, um homem com uma filosofia de vida questionável e fala rápida, que comanda o “Submarino Q e Sua Tripulação de Dois”, e sabe tudo a respeito dos Baudelaire, da Tia Josephine, do Lago Lacrimoso e cuja missão é encontrar o açucareiro antes do Conde Olaf. Tudo a tempo do encontro de C.S.C. na quinta-feira, no último santuário da organização, o Hotel Desenlace.
“Me arrepia o madeirame!”
Além do Capitão Andarré e de sua enteada Fiona, também reencontramos Phil, o otimista de “Serraria Baixo-Astral” que “cansou da indústria madeireira” e agora trabalha como cozinheiro em um submarino, e teve sua perna devorada por um tubarão na última semana… o seu otimismo, no entanto, continua intacto – Fiona até confessa aos Baudelaire que às vezes o acha “cansativo”, o que nos faz ver que ela é uma moça sensata, e provavelmente uma boa amiga aos Baudelaire. Fiona lhes explica que subiram o Arroio Enamorado em busca deles (era fácil seguir o seu traço com as notícias d’O Pundonor Diário, que embora mentirosas, sempre continham algo de verdadeiro, como a localização dos irmãos) e em busca do importantíssimo açucareiro, que não pode cair nas mãos do Conde Olaf, ou então “todos os esforços de todos os voluntários terão sido em vão”.
Mas o que não sabemos é: O QUE TEM DENTRO DO AÇUCAREIRO?!
Fiona não pode explicar-lhes, no entanto, pois o Capitão Andarré jamais lhe contou isso… disse que era perigoso demais, e que a colocaria em um perigo “maior do que eles podiam imaginar”. E com essas palavras, sentimos que Lemony Snicket nunca vai saciar nossa curiosidade em relação ao açucareiro. De todo modo, enquanto talvez surja um “namorico” entre Klaus e Fiona (palavras de Andarré!), eles estudam juntos cartas náuticas para tentar supor para onde o Arroio Enamorado carregou o açucareiro, tão crucial de ser encontrado antes do Conde Olaf. Enquanto isso, Violet coloca suas habilidades mecânicas em uso, e Sunny as culinárias – até que o detector por sonar indique uma outra forma se aproximando do Queequeg: um “polvo” gigantesco, pilotado pelo Conde Olaf, ao que tudo indica. Um “polvo” que só se afasta quando outra forma, um “ponto de interrogação”, surge no sonar.
“Uma coisa muito ruim. Pior ainda que o Conde Olaf, provavelmente”
LEMONY SNICKET SÓ AUMENTANDO O NÚMERO DE MISTÉRIOS!!!
Independente de saber o que existe dentro do açucareiro, todos sabem do quão vital é encontrá-lo, e Klaus estuda cartas náuticas até ter uma noção de onde ele pode estar: carregado pelas correntezas até uma oval marcada como “G.G.” nos mapas. Com a ajuda de Fiona (com quem Klaus compartilha algo parecido com o que Violet compartilhara com Quigley no livro anterior), Klaus descobre que deve se tratar da GRUTA GORGÔNEA, um lugar perigoso, uma gruta em formato cônico supostamente cheia de Mycelium Medusóide, um cogumelo letal que alterna entre as fases minguante e crescente – o que, basicamente, quer dizer que eles podem ser invisíveis em um momento, mas estarem ali para “atacá-los” no momento seguinte, e o seu veneno pode matar as crianças em menos de uma hora. Mesmo com esse risco, eles precisam buscar o açucareiro.
É assim que Violet, Klaus, Sunny e Fiona se veem em roupas e capacetes de mergulho, para adentrar a misteriosa caverna em busca do açucareiro, enquanto Lemony Snicket astutamente nos instiga ao descrever como seria a caverna se eles pudessem vê-la iluminada como anteriormente fora. A “Gruta Gorgônea” é quase outra base de operações de C.S.C., elaborada e repleta de secretos, inclusive uma passagem secreta que leva para cima – para uma ilha, possivelmente? Enquanto exploram a misteriosa praia atulhada que encontram dentro da Gruta Gorgônea, sob as ruínas da Aquáticos Anwhistle, as crianças não encontram nenhum açucareiro, mas acabam cercadas pelo Mycelium Medusóide, pavorosos cogumelos que parecem estar observando as crianças. As crianças ficam juntas uma das outras, esperando pela fase minguante, para que então possam ir embora.
E, aqui, temos UMA DAS MELHORES PASSAGENS DE “DESVENTURAS EM SÉRIE”. Porque eu adoro a maneira como Lemony Snicket amadureceu a narrativa conforme conhecemos as crianças e percebemos que eles não são apenas órfãos pulando de tutor em tutor e fugindo de um vilão que quer roubar sua fortuna… eles estão envolvidos em uma trama muito maior, que até então desconheciam. Eles percebem, com facilidade, que a gruta pertencera a C.S.C. e que guarda uma série de segredos interessantes além do desaparecido açucareiro, e enquanto esperam o letal cogumelo minguar, eles investigam… a Gruta Gorgônia é uma espécie de “Sala Precisa” de C.S.C., e aqui ganhamos novos significados para a sigla, como “Comunicação por Semiflutuações em Cânticos” e “Carreação de Supervoláteis Cogumelos”, além e ouvirmos um pouco mais sobre a cisão e Kit Snicket.
Mas o mais interessante está no fim do capítulo, e Lemony Snicket nos prende sem nos dizer o que, de fato, Violet descobriu. Ela estava pronta para contar o que a sua página d’O Pundonor dizia, mas se deteu ao ouvir o nome do irmão de Fiona: “Fernald”. Por algum motivo, ela não quis fazer nenhum comentário, e Lemony Snicket nos contou que ela temia que aquele segredo que agora carregava no bolso podia ser o início de uma cisão. O que de TÃO SÉRIO ameaçava a amizade dos Baudelaire com Fiona, que outrora parecera tão possível? Snicket ainda brinca com os nossos sentimentos falando sobre o “esporo do letal Mycelium Medusóide, que naquele exato momento brotava no pequeno espaço fechado de um dos capacetes de mergulho usados pelos órfãos Baudelaire”. No fim das contas, eles não estavam seguros. O capacete de Sunny foi infectado.
Então, é como se tudo saísse de controle. Lágrimas, raras até aqui, brotam, e como o submarino estava vazio, sem Phil ou Andarré, Fiona assume loucamente a posição de capitã, de forma quase assustadora ou, como Violet coloca, “volátil”. E enquanto eles discutem, eles não percebem que acabam de cair em uma perigosa armadilha: o polvo, submarino do Conde Olaf, está ali para “devorá-los”. Enquanto o tempo de Sunny corre e ela vai tossindo cada vez mais, os pulmões consumidos pelo Mycelium Medusóide, os Baudelaire e Fiona precisam passar por uma série de situações desconfortáveis, como as risadas patéticas e irritantes do Conde Olaf, o pavoroso vestido de polvo de Esmé Squalor, e Carmelita Spats, vestida de “princesa bailarina sapateadora e veterinária encantada”, fazendo um recital de dança… mas “Desventuras em Série” sempre tem bons plot twists.
E aqui vem mais um: o Homem de Mãos de Gancho é o irmão desaparecido de Fiona!
Fernald.
Quando as crianças são jogadas no calabouço do submarino em forma de polvo, e Fiona reencontra o irmão, Violet e Klaus se alegram porque, talvez, tenham uma chance de salvar sua irmãzinha mais nova… é muito difícil olhar para alguém que está “do lado errado da cisão”, alguém que já lhes causou tanto mal e os ameaçou tantas vezes, e esperar encontrar nele alguma coisa “boa” – porque, como ele próprio acredita, as pessoas não são “boas” ou “más”, mas uma mistura de tudo, e talvez eles não sejam assim tão diferentes, no fim das contas. Assim, ele acaba aceitando levar as crianças de volta ao Queequeg, onde talvez possam salvar Sunny, mas apenas se eles o levarem com eles, e talvez seja mais um comparsa do Conde Olaf que esteja desertando… eles começaram morrendo, a partir de “O Hospital Hostil”, e desde “O Escorregador de Gelo” eles apenas debandam.
E pelo bem de Sunny, eles precisam confiar no “Homem de Mãos de Gancho”.
Felizmente, Fernald e Fiona conseguem ajudar os Baudelaire a retornarem para o Queequeg enquanto Carmelita faz um ridículo recital de dança, e lá eles descobrem, num livro de Fiona, o antídoto que pode salvar a vida de Sunny, embora no caminho tenham um momento de cair em lágrimas que é de partir o coração. Lembro-me de como achei sofrido ver Klaus passar o seu aniversário na cadeia em “A Cidade Sinistra dos Corvos”, e “A Gruta Gorgônea” traz outro aniversário: OS QUINZE ANOS DE VIOLET BAUDELAIRE. Klaus e Violet, enquanto procuram por raiz-forte para salvar Sunny, encontram um bolo preparado por ela e por Phil, como uma surpresa para quando eles retornassem da Gruta Gorgônea, e é muito triste ver que eles tinham se esquecido disso… apenas não Sunny. E eles temem perder a irmãzinha mais nova, que salva a própria vida, encontrando um “substituto” para a raiz-forte: WASABI!
QUE ELES TROUXERAM DA GRUTA!
Assim, a vida de Sunny é salva e, enquanto os irmãos a colocam para dormir na cozinha, coberta por um pano de prato, as coisas mudam no Queequeg… o submarino recebe um telegrama de Quigley Quagmire (A EMOÇÃO DE VIOLET!), marcando um encontro em código para a terça-feira, na Praia de Sal. É maravilhoso ver os Baudelaire reunidos, depois de quase terem perdido a irmã, podendo decifrar juntos um código, como já fizeram tantas vezes – desde a carta da Tia Josephine em “O Lago das Sanguessugas”. Mas é incerto se eles poderão ou não chegar a esse encontro, pois o Conde Olaf nota o desaparecimento dos Baudelaire do calabouço e volta a invadir o Queequeg… dessa vez, no entanto, ele está acompanhando de uma nova comparsa: Fiona Andarré. É lamentável vê-la se voltar contra eles e se juntar ao Conde Olaf, mas Lemony Snicket enfatizara bastante o quanto ela era “volátil”.
Então não foi uma grande surpresa…
Mas talvez o Homem de Mãos de Gancho tivesse razão, no fim das contas, falando sobre como as pessoas “não eram vis nem nobres” – Fiona tomara sua decisão, não podia abandonar o seu irmão, talvez a única família que lhe restava, assim como os Baudelaire não puderam abandonar Sunny quando ela estava doente, mas isso não a faz, necessariamente, uma pessoa vil – apenas alguém que tomou as decisões equivocadas. Afinal de contas, ela beija Klaus rapidamente ao se despedir, e permite que eles escapem… e então os três Baudelaire estão novamente sozinhos, “navegando em águas não cartografadas”, enquanto Violet maneja o Queequeg, Klaus lê as cartas náuticas e Sunny conserta a vigia quebrada pelo Conde Olaf… e vê-la fazendo isso, e falando de forma compreensível, meio que me entristece, porque eu percebo como ela cresceu nesses livros todos!
Mais uma vez, Sunny não é mais um bebê…
Então, depois de um breve encontro com o “ponto de interrogação” no fundo do mar, que Lemony Snicket não diz o que é, os irmãos rumam para a PRAIA DE SAL, e assim como o autor fala continuamente sobre o “ciclo das águas”, parece um ciclo se fechando e, talvez, recomeçando quando os irmãos estão de volta no mesmo lugar onde receberam a notícia do incêndio na sua casa e a morte dos pais… a mesma Praia de Sal enevoada, a mesma reação de Sunny: “Argh!”, disse Sunny, o que queria dizer: “Olhem só a figura misteriosa que está emergindo da névoa!” É tão MARAVILHOSAMENTE NOSTÁLGICO ler isso novamente. Dessa vez, no entanto, os Baudelaire têm mais informações, e um telegrama de Quigley Quagmire, e não vão com o Sr. Poe, como da última vez. Dessa vez, eles preferem entrar num taxi com uma desconhecida, mas que inspira confiança…
Seu nome? KIT SNICKET.
<3

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