Desventuras em Série, Livro Duodécimo – O Penúltimo Perigo



O último refúgio de C.S.C.: O Hotel Desenlace.
Na sua penúltima aventura, Lemony Snicket promete o DESENLACE para a história dos Irmãos Baudelaire – e realmente percebemos algumas coisas começarem a fazer sentido, enquanto muitos outros mistérios ainda estão no ar, mas o autor já está com um tom de despedida… ao fim do livro, por exemplo, “é a última vez que as crianças se afastam do Sr. Poe” e uma série de outras dicas a respeito do fim da saga, a começar pelo próprio título. As crianças, com a ajuda de uma desconhecida, enfim chegaram ao ÚLTIMO LUGAR SEGURO DE C.S.C., o Hotel Desenlace, onde encontram uma série de rostos conhecidos, perdidos entre voluntários e vilões, e essa é uma jornada que faz os Baudelaire crescerem um pouco mais… não apenas Sunny, em quem o crescimento é mais visível, mas em cada uma delas. Eles já não são mais as mesmas crianças da Praia de Sal…

Caro Leitor,

Se este é o primeiro livro que você encontrou enquanto procurava o próximo livro para ler, então a primeira coisa que precisa saber é que este livro próximo-ao-último é o que você deve pôr de lado primeiro. Infelizmente, este livro apresenta a crônica próxima-à-última da vida dos órfãos Baudelaire, e é próxima-à-primeira em sua oferta de miséria, desespero e desprazeres.
Provavelmente as coisas próximas-à-última a respeito das quais você gostaria de ler são um lançador de arpões, um salão de bronzeamento em uma cobertura, duas iniciais misteriosas, três trigêmeos não identificados, um notório vilão e um curry insípido.
As coisas próximas-à-última são as primeiras a serem evitadas, portanto permita-me recomendar que você ponha este livro próximo-ao-último de lado primeiro, e encontre alguma outra coisa para ser a próxima a ler, para que este livro próximo-ao-último não se torne o último livro que você lerá.

Respeitosamente,
Lemony Snicket

“O Penúltimo Perigo” tem um dos inícios mais eletrizantes da história de “Desventuras em Série” – na verdade, um dos melhores desenvolvimentos também… estamos muito perto da finalização da série, e embora Lemony Snicket nos chame a atenção para como a cada resposta que os Baudelaire ganham, junto eles recebem uma quantidade enorme de “novas perguntas”, as coisas estão se resolvendo, se tornando maior, e é ótimo ver as peças se juntando. Conhecer Kit Snicket, embora tão misteriosa, e saber que ela esteve em uma peça de teatro com a mãe dos Baudelaire, por exemplo… ou saber que ela esteve com Quigley Quagmire recentemente, que precisou partir para ajudar Duncan e Isadora, além de Hector, na casa móvel autossustentável a ar quente, que está sendo atacada. Além, é claro, dos voluntários e inimigos conhecidos que eles encontrarão no Hotel Desenlace…
A chegada ao Hotel Desenlace é peculiar, tanto quanto fora a chegada à cidade dos Cultores Solidários de Corvídeos, ou ao Hospital Heimlich: o hotel é um reflexo perfeito em um lago, construído para confundir as pessoas, até que os Baudelaire possam vê-lo, do outro lado do lago – antes de entrarem, eles compartilham um brunch com Kit Snicket, e ela lhes dá algumas informações e instruções: por exemplo, o AÇUCAREIRO (ou o Continente Sacarífero Codificado) está a caminho do Hotel Desenlace, e um impostor se passando por Jacques Snicket fez check-in recentemente: sua missão no Hotel é seguir o impostor J.S. e decidir se ele é “voluntário” ou “inimigo”, para saber se podem permitir que o açucareiro caia em suas mãos ou não… os Baudelaire também devem observar e informar os demais voluntários se é seguro manter o encontro na quinta-feira ou não.
WOW!
De uma vez por todas, Lemony Snicket os transforma em voluntários. “Vocês não são mais crianças, irmãos Baudelaire. Vocês são voluntários, prontos para enfrentar os desafios de um mundo desesperado e desconcertante”. A única pessoa que eles sabem que estará lá dentro e os ajudará é Frank – mas ele tem um irmão gêmeo idêntico que está do outro lado da cisão. Claro. Típico de “Desventuras em Série”. Assim, quando os Baudelaire entram no Hotel Desenlace, como voluntários disfarçados de concierges, eles encontram ambos os irmãos, alternando-se, e nunca sabemos se estamos diante de Frank ou de Ernest, o que é um verdadeiro desespero – porque estamos o tempo todo tentando adivinhar o que ele quer dizer com o que está falando… de todo modo, ambos explicam para ele como funciona o Hotel, e como ele é, basicamente, uma IMENSA BIBLIOTECA, seguindo o Sistema Decimal Dewey…
Então, eles começam a trabalhar. Três sinetas, representando três hóspedes diferentes, tocam simultaneamente, e Lemony Snicket nos explica, no genial, divertido e irônico “NÃO É UM CAPÍTULO”, que os acontecimentos dos próximos três capítulos acontecem ao mesmo tempo e, portanto, não precisam ser lidos em ordem. No primeiro deles, vemos Violet no salão de bronzeamento da cobertura. É um lugar bizarro, claro, cheio de espelhos, e com um cara virando os hóspedes com espátulas gigantes (!), e Violet encontra três pessoas conhecidas e detestáveis: Esmé Squalor, usando apenas folhas de alface como roupa, Geraldine Julienne, a horrível repórter d’O Pundonor Diário, e Carmelita Spats, a irritante menina, agora vestida como “jogador de futebol caubói super-herói e soldado pirata” – e foi ela que chamou a Violet-concierge, pedindo um LANÇADOR DE ARPÕES.
Esmé fala de “observar o céu” com seus binossolares, e Carmelita pede um lançador de arpões.
O que isso quer dizer?
No capítulo seguinte, acompanhamos Klaus no Quarto 674, onde ele também reencontra algumas pessoas conhecidas – a primeira que ele nota é o “Senhor”, o dono da Serraria Alto-Astral em Paltryville, onde os irmãos passaram um tempo trabalhando e sendo pagos em cupons e chicletes… com ele (que ainda tem uma nuvem de fumaça cobrindo o rosto), Klaus também reconhece Charles, que sempre fora bom e educado com eles, mas cujos esforços ralos foram inúteis para salvá-los das situações desagradáveis da época. Klaus leva os dois até a sauna na Sala 613, onde entra para ouvir uma conversa que não revela muita coisa. Sabemos que ambos receberam recados de “J.S.”, e que estão em busca dos Baudelaire… mas por quê?! Por fim, Klaus não consegue descobrir muita coisa e é incumbido de colocar um papel pega-pássaros da janela da sauna em direção ao lago… e por quê?!
Por fim, então, acompanhamos os reencontros e descobertas de Sunny, no Quarto 371 e no Restaurante na Sala 954. No Quarto 371, onde foi chamada pela sineta, Sunny reencontra o pavoroso Vice-Diretor Nero e seu violino incessante, além dos insuportáveis Sr. Remora e Sra. Bass, mas não consegue descobrir o que eles estão fazendo no Hotel Desenlace. Ela avança um pouco mais em suas investigações no Restaurante 954, onde presencia Hal (sim, do Hospital Heimlich!) tendo uma conversa com Frank, ou Ernest, no qual ouvimos a já famosa pergunta de “Você é quem eu penso que é?” Ali, eles falam sobre “açúcar” e sobre “ir para a lavagem depois da meia-noite”, e ao que tudo indica o AÇUCAREIRO (!) está chegando no Hotel Desenlace, e Sunny acaba de protegê-lo no subsolo, fechando a porta da lavanderia, na Sala 025, com o Cerramento Supravernacular Complexo.
ADOREI os três capítulos em que acompanhamos as crianças separadas, mas Lemony Snicket realmente trata cada um dos capítulos com independência, agindo como se não tivéssemos lido os demais – afinal de contas, ele disse que não precisávamos ler em ordem, não? Nas semelhanças dos capítulos, encontramos sempre um dos irmãos (Frank ou Ernest), e ele pergunta aos irmãos: “Você é quem eu penso que é?” Em todas as situações, eles pensam no que responder, mas sem saber se a pessoa que pergunta é um vilão ou um voluntário, eles preferem uma “resposta segura” padrão: “É claro que sou quem pensa que sou. Sou um concierge”. Também existe o sinistro e enigmático “Fico grato pela sua ajuda, concierge. Não são muitas pessoas que têm a coragem de ajudar em um esquema como este”. E todos os capítulos terminam com o relógio do Hotel anunciando três horas.
“Nadabom! Nadabom! Nadabom!”
Durante todo o resto do dia, as crianças trabalham como concierges, incapazes de conversar sobre o que observaram até que a noite caia e os hóspedes parem de chamar os seus serviços – então, eles são capazes de entender que o Açucareiro está sendo trazido para o Hotel, onde estará protegido dos vilões ou dos voluntários pela fechadura que Sunny colocou lá, e será trazido por corvos, o que justifica Esmé olhando para o céu e Carmelita pedindo um arpão, bem como o papel pega-pássaros que Klaus colocou do lado de fora da janela da sauna… no entanto, eles ainda não conseguem entender o que isso tudo quer dizer, nem tampouco quem é “J.S.”, a chave de todo o mistério. Enquanto tentam entender isso tudo, eles são surpreendidos por uma figura misteriosa descendo do teto no escuro e pedindo desculpas por “ter se revelado só agora”, mas antes ele precisava saber se “eles eram quem ele pensava que fossem”. Agora, eles caminham para fora do Hotel, em busca de respostas, acompanhando um homem que não é nem Frank nem Ernest.
Do lado de fora, os Baudelaire conhecem Dewey, um trigêmeo de Frank e Ernest, que aparentemente é em quem pode confiar, e quem os conta sobre o catálogo que reúne na lagoa, onde o “HOTEL DESENLACE” não é espelhado – na madrugada para amanhecer quarta-feira, um dia antes do “grande evento”, os Irmãos Baudelaire são constantemente assegurados de que “tudo vai ficar bem”. Dewey os convida a ficar no Hotel e transformá-lo em um lar permanente, enquanto eles o ajudam com o catálogo, mas nós sabemos que isso não pode simplesmente acontecer. Já tivemos essa esperança antes, quando o Dr. Montgomery Montgomery era um tutor maravilhoso que queria cuidar dos Baudelaire para sempre, por exemplo, antes de ser brutalmente assassinado… portanto, não colocamos muitas esperanças nisso, mas meio que as colocamos na chegada das próximas duas pessoas.
“Juíza Strauss!”
“Jerome Squalor”
“J.S.!”
Adoro como Lemony Snicket guia sua história, como é astuto e como nos engana perfeitamente – ele nos fez pensar em “J.S.” como “Jacques Snicket” e, portanto, um impostor se registrando no Hotel, mas temos dois J.S. legítimos de volta, e é maravilhoso tê-los por perto. Ainda com todas suas falhas,eles se arrependeram de ter deixado os Baudelaire em risco e os buscaram incessantemente, se tornando voluntários e ajudando C.S.C. “incomensuravelmente”. Agora, ao invés de sair batendo o pé, ofendidos, os irmãos “queriam perdoar aqueles dois adultos, e abraçá-los, a despeito da sua decepção”. E é o que fazem… os adultos, por sua vez, prometem que “amanhã todos os problemas dos Baudelaire chegarão ao fim”, porque os voluntários de C.S.C. têm investigado e recolhido provas dos crimes do Conde Olaf, e ele será julgado na quinta-feira pela Juíza Strauss e a Corte Suprema, mas, como Lemony Snicket diz, “os Baudelaire não nasceram ontem”.
E não deixam suas esperanças crescerem.
Até porque o Conde Olaf enfim aparece no livro pela primeira vez… e na vida dos irmãos, pela penúltima.
Os irmãos Baudelaire entram no saguão do Hotel Desenlace acompanhado pelos três adultos, e aquilo vira um verdadeiro confronto entre voluntários e vilões, com a chegada também de Esmé Squalor e Carmelita Spats, cheio de ameaças, risadas pérfidas e finais pavorosos. Tivemos até dicas não muito claras do que contém o Açucareiro, mas descobrimos que “é importante para os Baudelaire e para os Snicket”, além do Conde Olaf enfim se voltando contra a insuportável da Carmelita, dizendo que “ela é uma garotinha mimada” e contra a chata Esmé, que só pensa no que é in e no que é out. Então, ele aponta o lançador de arpões para Dewey para saber como abrir a lavanderia, onde o Açucareiro pode estar, e as crianças tentam impedi-lo de atirar, em uma sequência TENSA que cria um suspense perfeito, culminando numa tosse do inútil do Sr. Poe e um acidente causado tanto pelo Conde Olaf quanto pelos Irmãos Baudelaire, que derruba o lançador de arpões e o faz disparar.
Matando Dewey Dénouement…
Dewey ainda consegue caminhar até o lado de fora e cair no lago – a última coisa que diz, enquanto seu corpo afunda na água escura, é um nome: “Kit”. Os irmãos assistem, chorando, sentindo que falharam com ele… E É UM DOS MOMENTOS MAIS TRISTES NAS TRISTÍSSIMAS VIDAS DOS ÓRFÃOS BAUDELAIRE. No entanto, eles precisam deixar para sofrer essa morte mais tarde, pois a psicologia das turbas se volta novamente contra eles, como na cidade dos Cultores Solidários de Corvídeos, e eles são acusados de assassinato – inclusive pelo inútil e irritante do Sr. Poe, que os reconhece e acredita que foram eles que mataram Dewey. Talvez eles devessem ter aceitado a ajuda do misterioso motorista de táxi (que, ao que tudo indica, era o próprio Lemony Snicket, não?), mas eles acabam ficando mesmo no Hotel Desenlace, aguardando o julgamento do Conde Olaf…
Mas o Conde Olaf está muito tranquilo com isso tudo. Assim, as crianças acabam trancadas dentro de um armário pequeno e escuro, aconchegados uns aos outros, enquanto esperam o julgamento, e choram até adormecer, abraçados. E, naturalmente, em se tratando das Crianças Baudelaire, motivos para chorar elas tinham e continuam tendo. O julgamento é uma verdadeira palhaçada, com vendas nos olhos (para representar a “justiça cega”), e chega a ser risível os “depoimentos” do Conde Olaf, em meio aos “hmm” da Juíza Strauss. Então, enquanto as crianças narram seus acontecimentos, elas se dão conta de quem são os outros dois juízes com Strauss e do que é o som que ela está fazendo: ela está sendo sequestrada. Então, o homem com barba mas sem cabelo e a mulher com cabelo mas sem barba, os tais juízes, tentam encobrir a fuga do Conde Olaf.
O Conde Olaf leva a Juíza Strauss pelo elevador, como refém, para entrar na lavanderia e roubar o açucareiro – seu plano envolve roubar o açucareiro, depois subir à cobertura e recuperar o Mycelium Medusóide, voltar ao saguão e infectar todo mundo, e então fugir pela cobertura – as crianças, escapando do pavoroso “julgamento”, vão atrás do Conde Olaf no elevador, e então descobrem que a Juíza Strauss os decepcionou mais uma vez, passando todas as informações sobre eles ao homem com barba mas sem cabelo e à mulher com cabelo mas sem barba, comparsas do Conde Olaf. E então eles fazem coisas que, à primeira vista, parecem terríveis – Klaus ajuda o Conde Olaf a abrir a porta da lavanderia, para a perplexidade das irmãs, mas porque sabe que o Açucareiro não está lá; Violet se voluntaria a ajudá-lo a escapar com o barco na cobertura, desde que ele os leve com ele (eles precisam escapar do Hotel Desenlace!); e, por fim, Sunny oferece sua contribuição, ao dizer:
“Incendiar hotel”
Klaus e Violet reagem com ainda mais perplexidade quando a menor dos Baudelaire incentiva o Conde a INCENDIAR O HOTEL DESENLACE, e isso é o ápice de uma jornada que começou para os irmãos a alguns volumes de suas “Desventuras em Série”: eles se perguntam se continuam sendo “pessoas nobres” ou já cometeram tantos atos perversos que são mais parecidos com os vilões de quem vivem escapando – e, naquele momento, eles tinham a sensação de que “estavam se afastando aos trambolhões de todas as pessoas nobres do mundo”. Sunny fez o que precisava ser feito para que o Conde Olaf não liberasse o fungo que certamente mataria a todas as pessoas no Hotel Desenlace, e para enviar a C.S.C. o sinal que Kit Snicket pedira que eles enviassem se o encontro no dia seguinte não fosse mais seguro… mesmo assim, ela faz de tudo para salvar o máximo de vidas possíveis, apertando todos os botões do elevador.
Sunny Baudelaire ainda tem uma última passagem importante no livro. Eu gosto de como a longa série de Lemony Snicket nos permitiu estar ao lado dessas crianças tempo o suficiente para que as vejamos mudar… Violet, Klaus e Sunny de “O Penúltimo Perigo” fazem coisas que as crianças de “Mau Começo” jamais fariam – talvez nem mesmo as crianças de “O Escorregador de Gelo”, quando elas não tiveram coragem de seguir com o plano e deixar Esmé Squalor cair em uma armadilha. Dessa vez, além de atear fogo ao Hotel Desenlace (porque eles tinham que fazer isso e mandar um sinal a C.S.C.), elas não acreditam mais que a justiça possa ajudá-las, ou que “tudo vai ficar bem”. Por isso, quando a Juíza Strauss pede que eles não vão embora, Sunny morde a mão da juíza para que ela solte o barco, e elas fogem com o Conde Olaf. “O último lugar seguro não é mais seguro”, diz Sunny, que já não é mais um bebê, e as crianças se perguntam se ainda são os nobres voluntários que queriam ser.
Porque agora, elas “estão no mesmo barco que o Conde Olaf”.
E o fim está próximo.

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