Deus é Brasileiro (2003)
“Minha vida é andar por este país…”
Com direção
de Carlos Diegues e com um roteiro baseado no conto “O Santo que não acreditava em Deus”, de João Ubaldo Ribeiro, com
adaptação de Carlos Diegues, João Emanuel Carneiro e Renata de Almeida, “Deus é Brasileiro” é um delicioso
filme nacional protagonizado por Antônio Fagundes, Wagner Moura e Paloma Duarte
que explora a comédia, um pouco da cultura brasileira e paisagens do nordeste
de nosso país, passando por Alagoas, Tocantins e Pernambuco. O filme começa
quando Deus decide “tirar umas férias”. Ele está cansado de tanta reclamação e
pedidos e, principalmente, do fato de a humanidade cometer um monte de erros e
tentar colocar a culpa nele o tempo todo… ele quer descansar, umas férias entre as estrelas.
Para poder
sair de férias, no entanto, Deus precisa encontrar um substituto – um santo que
possa ficar no seu lugar na sua ausência, “tomando conta de tudo”, e ele
decidiu que esse santo será um brasileiro chamado Quinca das Mulas: afinal de
contas, o Brasil é um país religioso, mas que não tinha nenhum santo canonizado
até então (o filme é de 2003 e o primeiro santo brasileiro foi canonizado em 2007,
pelo Papa Bento XVI). Encontrar Quinca das Mulas é que se mostra uma tarefa
difícil… e Deus tem a companhia de Edvaltécio Barbosa da Anunciação, o Taoca,
que é quem vai servir de “guia” nessa busca que atravessa tantos lugares,
porque toda vez que eles chegam a um lugar, Quinca das Mulas parece ter andado
para outro…
Muito do
filme está justamente na interação de Deus e de Taoca – Antônio Fagundes e
Wagner Moura estão MARAVILHOSOS em seus papeis, e entregam personagens
cativantes e divertidos. Taoca é um homem de coração bom, mas malandro, que
espera conseguir algo em troca por estar ajudando Deus nessa jornada toda;
Deus, que Taoca apresenta aos demais como “o Professor Emanuel Salvador”, está
beirando a rabugice de uma maneira cômica e compreensível, porque Ele realmente
está cansado e precisa descansar. Os diálogos são muito bons (a relação de Deus
com os “milagres”, por exemplo, e sua explicação de por que não os faz muito),
as sacadas são inteligentes, as piadas funcionam muito bem… é uma experiência divertidíssima!
Ao grupo
também se une, eventualmente, Madá, uma mulher que Taoca e Deus conhecem em um
velório e que está querendo ir para São Paulo… ou, na verdade, sair dali,
independente de para onde eles estejam indo. Mesmo que o “Professor” queira deixá-la
para trás, ela encontra uma maneira de estar com eles quando eles partem de
Alagoas e vão mais fundo para dentro do Brasil, em busca de Quinca das Mulas, o
“santo” que está sempre trabalhando pelo bem dos demais… ao que parece. Gosto
de como essa jornada do trio pelo nordeste brasileiro permite que novos ares e
lugares sejam explorados, em um filme que dá uma sensação gostosa de
brasilidade – o que é essencial dentro de sua proposta de que “Deus é
Brasileiro”, não?
Quinca das
Mulas não é exatamente quem Deus estava esperando que ele fosse… talvez ele não
seja o candidato ideal para assumir o Seu lugar (adoro o fato de o Taoca tentar
em vários momentos se “voluntariar” para a posição). Deus o encontra em uma
aldeia indígena, mas Quinca das Mulas não está disposto a testar se o que
aquele homem está dizendo é verdade quando ele lhe diz que pode curar uma
criança doente da aldeia, e tampouco acredita quando Deus faz os dias e as
noites passarem depressa, porque Ele pode fazer qualquer coisa… Quinca das Mulas
chama isso de um truque, de uma ilusão e anuncia que ele é não acredita em
Deus. Ateu convicto, ele não pode assumir a posição de “Deus”, nem que seja por
um período curto durante as férias do titular.
Frustrado e
desiludido, Deus percebe que ele não vai poder tirar suas férias… e Ele está um
pouco chateado também, e decide apenas “ir embora”: para isso, no entanto, Ele
precisa que Taoca O leve de volta para o mesmo lugar em que O encontrou, lá no
meio do rio em Alagoas, para que não precise abrir outra passagem e consertar
mais coisas depois. O caminho de volta é menos explorado do que o de ida, e tem
um clima muito diferente do clima de
quase “aventura” que acompanhou o trio na primeira vez. Inclusive, a jornada
quase acaba com a morte de Madá e com o Taoca dizendo a Deus que Ele não ama
ninguém e que não tem coração – embora tenha sido Ele a inventar o coração. Mas Madá não estava morta, porque tinha sido
salva por uma medalhinha…
Deus sabia disso, é claro.
Taoca só descobre quando Deus já não está
mais fisicamente ali.
O filme pode
ser curiosamente reflexivo. Temos alguns diálogos muito interessantes a
respeito do tempo, do que é o amor, de cobrança, de gratidão, de escolhas… Deus
criou a humanidade e, logo em seguida, o livre arbítrio, e pode até ser que Ele
se irrite com algumas atitudes como as guerras desenfreadas ou as cobranças
absurdas que O culpam por coisas das quais Ele não tem culpa, mas isso não quer
dizer que Ele não nos ame… eu acho que “Deus
é Brasileiro” termina com Taoca entendendo isso mais do que nunca, e
ganhando uma “recompensa” que é uma conexão sincera e verdadeira com Madá,
muito melhor do que qualquer coisa material; Deus, por sua vez, não consegue
suas férias nas estrelas, mas teve umas férias curtas no Brasil, e pôde revisitar sua criação…
Esse contato
com a humanidade certamente Lhe faz bem!
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