Tengo Que Morir Todas las Noches 1x02 – Sexo

Beleza e melancolia.

“Tengo Que Morir Todas las Noches” é uma série PODEROSA. “Sexo”, o segundo episódio da série, dança com maestria entre os prazeres e descobertas de uma comunidade silenciada e oprimida e as forças que tentam a calar, do ponto de vista de diferentes personagens com vivências distintas: Memo, um jovem que acaba de chegar à cidade grande, descobre o El Nueve como um lugar no qual ele pode ser ele mesmo, mas vive com Rogélio, um irmão policial e preconceituoso, que está fechando bares gays pela cidade; Blas, uma alma livre e aparentemente destemida, que na verdade esconde seus medos; Aída, uma cantora que cogita “voltar para o armário” para que não lhe sejam negadas as chances que ela espera ter na vida artística.

É uma excelente e abrangente narrativa.

No fim do primeiro episódio, Memo reencontrou Blas, que conhecera anteriormente na faculdade, no El Nueve, e depois de um beijo inspirado, talvez ele esperasse “viver uma tórrida história de amor tradicional” ou qualquer coisa assim, e ele se surpreende com o fato de que esse não é o Blas, não é como ele vive… Memo acaba indo embora deixando o Blas transando com outro homem no banheiro do bar, e em parte ele está de coração partido pelas esperanças frustradas… no seu caminho de volta, ele enfrenta o preconceito de uns caras em uma borracharia, que o ameaçam, roubam sua carteira e sua câmera e o deixam ir para casa com ele sentindo que uma noite que já não estava perfeita acabou de ficar ainda pior – e de fato ficou.

Tem uma cena nesse segundo episódio de “Tengo Que Morir Todas las Noches” que é uma montagem impressionante e inteligente ao explorar a abrangência e os sentimentos dessa série. O paralelo entre a) uma performance libertadora de dança no El Nueve, com o seu quê de sensualidade e provocação; b) o Blas e Aída dançando nus em uma festa ousada à qual comparecem depois de deixar o bar; e c) o Memo fumando na janela do quarto e, depois, se masturbando olhando para a foto que conseguira do homem nu no episódio anterior. A junção dessas três cenas é pura ARTE. Também acho interessante o contraste da opressão de Rogélio o obrigando a levar uma garota para o quarto e o sentimento de liberdade quando eles se entendem e Memo passa a noite tirando fotos dela.

Acho que Blas é muito mais complexo do que notamos de relance. Inclusive, chego a pensar que sua ideia de “não ter namorado” é uma maneira de escapar da possibilidade de se apegar e perder… as cenas em que ele visita Pepe, um antigo bartender do El Nueve, no hospital são fortes, tristes e reveladoras. É doloroso e revoltante ver a maneira como a desinstrução leva pessoas supostamente esclarecidas a comentários repletos de preconceito, como quando a enfermeira diz a Blas que “as coisas estão ficando difíceis para eles”. É através de Pepe, inicialmente, e de Alonso, depois, que o tema do surto de AIDS é trazido à tona na série, e Alonso é um ponto importante: outrora cliente do El Nueve, a mãe culpa o lugar pelo filho ter ficado doente…

Agora, existe todo um movimento para fechar o El Nueve.

E, por causa de Rogélio, Memo se envolve nessa trama toda. Quiçá seja uma vantagem…

O El Nueve é o cenário de muita coisa, é o lugar mais importante de “Tengo Que Morir Todas las Noches” – é lá que as histórias começam, acontecem ou para onde convergem. Se é um refúgio para Blas e o primeiro lugar no qual Memo se sente deveras acolhido, ele se converte em algo quase assustador para Aída, que é reconhecida quando vai ao banheiro e sente que todo mundo a está observando… a conversa de Aída com Glória sobre isso é bastante dolorosa, e é triste ouvir Glória falando, mais tarde, sobre como aquele era para ser um lugar no qual elas não precisavam se esconder e podiam ser elas mesmas, mas, mesmo ali, Aída não quer ser vista com outra mulher. Ela vive em constante medo de “ser descoberta” e, por isso, perder a carreira.

A maneira como é falado abertamente sobre “voltar para o armário e se trancar lá dentro” para ter sucesso como cantora é de uma violência tão grande – e, infelizmente, de uma realidade assustadora também. Em partes, ainda hoje em dia… quem dirá naquele lugar, naquela época? Não sei se as escolhas artísticas de Aída estão corretas… quem é ela como cantora, afinal? Ela é a cantora comedida idealizada por Glória que parece estar “cantando para senhoras que querem se sentir jovens novamente” ou ela é a cantora que Raúl enxerga e leva para um programa de televisão no qual Glória não pensa em pisar? Ainda temos bastante drama para desenvolver aqui, tanto na vida pessoal quanto na vida profissional de Aída e de Glória.

Por fim, menciono a beleza da cena da primeira vez de Blas e Memo… eu gosto de como a cena equilibra desejo e paixão com sensibilidade e cuidado. Tudo é muito intenso e muito prazeroso, mas, ao mesmo tempo, muito delicado. Uma cena bonita de entrega e conexão que se torna completa com o momento em que Memo desperta no dia seguinte, depois de ter dormido sobre o peito de Blas, ambos ainda nus – é de uma intimidade sem tamanho! E, nos paralelos muito bem feitos desse segundo episódio de “Tengo Que Morir Todas las Noches”, vemos em paralelo Rogélio indo até a borracharia onde roubaram Memo para recuperar a câmera do irmão, e para dizer que “ninguém chama o seu irmão de gay”. Sério, que combinações fantásticas!

Uma série e tanto!

 

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