Terra Estrangeira


Terra Estrangeira é um filme luso-brasileiro de 1996, classificado sob o gênero de suspense, mas é muito mais do que isso; pode ser um clássico, um suspense, um drama, um filme de cotidiano ou de fuga, ou um road movie. Na realidade, cada um desses estilos mesclam-se com precisão ao longo do filme, abrangente em seu estilo e competente em cada um.. Narra a história de Paco, que deseja ir para a Espanha e conhecer a terra de sua mãe (San Sebastián), no entanto possui o dinheiro necessário graças ao confisco feito por Collor. Dessa maneira, aceita uma oferta de Igor de levar uma encomenda misteriosa até Portugal, cujo pagamento lhe renderia as despesas da viagem.
O pacote desaparece rapidamente, mas já em Portugal, Paco conhece uma brasileira que trabalha como garçonete, Alex, e os dois tentam uma escapada magistral rumo a Espanha e a terra da mãe de Paco enquanto bandidos os perseguem, sempre preocupados em colocar as mãos na tal encomenda desaparecida. E o filme apresenta um ótimo enredo bem amarrado, envolvente, com interpretações cativantes. Com atores que se encaixam em seus papéis, o filme se sustenta com um elenco não muito grande e nem grandes produções, mas competência e história.
Uma das características técnicas mais interessantes do filme é o fato de ele não ter cores. O tom envelhecido produz uma consistente atmosfera de antigo/clássico, e ao mesmo tempo em que o roteiro se propõe a se situar claramente em um momento histórico brasileiro e alguns problemas econômicos/políticos da época, ele acaba se tornando atemporal. A filmagem próxima à amadora e a simplicidade das cores trazem a impressão de um registro que se torna bem interessante a atraente ao telespectador.
Mas em se falando de filmagem próxima à amadora, o filme brinca com a câmera o tempo todo. A sensação proporcionada pela câmera que segue Paco em seus maiores momentos de loucura (como indo atrás de Alex para saber do violino) ou que enxerga os acontecimentos de dentro do carro, e se locomove junto aos personagens dá essa sensação de que o espectador também está participando do filme, está assistindo como se estivesse realmente na cena, ao lado dos personagens. E justamente no momento Igor vai aparecer pela primeira vez (com Paco extremamente triste, já bastante bêbado no bar), a câmera opta por nos mostrar um plano do alto, como de uma câmera de segurança, ou um inseto… aquela impressão de algo que está por vir (a missão dada por Igor a Paco), algo maior do que o protagonista, que ele não poderá controlar, mas que guiará o roteiro…
O roteiro é cautelosamente guiado com base nos mais clássicos padrões do cinema: o protagonista tem sua história, seu passado (sua introdução/apresentação) e as motivações que o levam a desejar algo. O objeto de desejo, nesse caso, está em conhecer San Sebastián, a cidade de sua mãe e assim se sentir um pouco mais próximo a ela. Entre o protagonista iniciante, que ninguém conhecia, e o final (que chegaria a seu objetivo), todas as provações que dão forma ao enredo são colocadas precisamente, como o roubo do violino, a briga com Alex e a subseqüente união com ela, a polícia na fronteira e assim por diante…
O filme ainda é inteligentíssimo pela variedade lingüística, encantadora a qualquer estudante de Letras. Sendo um filme luso-brasileiro, já era de se esperar os dois portugueses (que parecem, realmente, duas línguas distintas, quase impossível entender o português de Portugal em alguns momentos, auxiliados pela legenda), mas também o espanhol, proveniente da proximidade geográfica de Portugal e Espanha e os desejos do “herói” de atingir esse outro país. Algumas sequências de code switching ou de diálogos bilíngues ou mesmo trilíngues, em um amplo léxico e sotaque que mereceriam um estudo a parte.
Por fim, o filme é bastante interessante em quase todos seus aspectos. Possui uma história convincente e bem narrada, com interpretações que conseguiram prender o espectador e pequenos artifícios técnicos que tornaram tudo ainda mais interessante. Vale a pena e é recomendado a todos que gostam de um drama e um pouquinho de emoção para finalizar. Até mais!

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