Doctor Who (2024) 1x04 – 73 Yards

Semperdistans.

Eu passei o episódio todo EM ÊXTASE! Com toques de “The Twilight Zone” e “Black Mirror”, “73 Yards”, o quarto episódio da nova temporada de “Doctor Who”, me deixou com aquela sensação gostosa de “ISSO é ‘Doctor Who’”. É um pouco louco, levanta perguntas e não responde todas elas, mistura diferentes gêneros da ficção e é fascinante e envolvente do início ao fim. Gosto de quando “Doctor Who” escapa um pouquinho de sua narrativa convencional, alternando pontos de vista, por exemplo, e esse é um daqueles episódios que é protagonizado pela companion. Acompanhamos aproximadamente 82 anos da vida de Ruby Sunday (!), em uma narrativa inusitada que tem uma carinha daquelas séries antológicas, e já é o meu episódio favorito na temporada!

Tudo começa quando a TARDIS chega no País de Gales, na época atual mesmo, e o Doctor e Ruby têm um diálogo interessantíssimo sobre como “Ruby esteve ali 3 vezes” (!) ou como “Roger ap Gwilliam não é um bom exemplo de galês”, mas o Doctor percebe que ele está um pouco adiantado, porque Ruby é de 2024, e Roger será eleito primeiro-ministro em 2046. As coisas começam a ficar estranhas quando o Doctor pisa em algo e rompe um círculo levantado para Mad Jack, e Ruby lê duas mensagens que foram deixadas em pequenos pergaminhos ali… no limiar entre a terra e o mar, um lugar que não é nem uma coisa nem outra, onde algumas regras são suspensas. E, então, o Doctor “desaparece” e Ruby se vê sozinha – a não ser por uma mulher que a observa à distância.

A exatamente 73 jardas.

A construção da narrativa tem algo de sobrenatural que cria um suspense magnífico. Tanto quando esse “sobrenatural” está sendo alvo de deboche, como na icônica sequência do bar em Glyngatwg, quanto quando realmente tem algo acontecendo, como quando Ruby perde as únicas pessoas que poderiam ajudá-la e que deveriam ficar ao seu lado… a mulher que “a segue, mas nunca se aproxima” parece mais intrigante e inexplicável do que, de fato, sinistra. E o que acontece quando as pessoas se aproximam dela e simplesmente correm na direção oposta a Ruby? Acontece com a mulher que a encontra próxima à TARDIS no início do episódio; acontece com o homem que deixa o bar; e, eventualmente, acontece também com a mãe de Ruby e com Kate Stewart.

Inclusive, duas das sequências mais f*das do episódio! A cena em que a mãe de Ruby tenta ajudar a filha indo falar com a mulher e depois ela vai embora e passa a ignorar Ruby é quase inesperada, mesmo que seja o padrão até ali. É doloroso ver a Ruby sendo ignorada pela mãe, e o momento em que Ruby tenta entrar em casa, a fechadura foi trocada e, ao telefone, a mãe diz que “não é sua mãe de verdade e que a sua mãe biológica nem quis saber dela” é, provavelmente, o pior momento da vida de Ruby. Depois, com mais de um ano da mulher “a seguindo”, Ruby quase ganha a ajuda especializada da UNIT, Kate Stewart garante que eles têm treinamento… e mesmo eles se afastam. Mesmo a Kate, que não se aproxima da mulher e que é afetada só pelo comunicador.

Preciso dizer que a estranheza causada por essa situação e a proposital falta de explicação é algo que me fascina. É algo que parece transcender o episódio, quase nos afetar, e eu gosto da sensação… depois de perder a mãe e qualquer possibilidade de ajuda da UNIT, Ruby entende que não adianta pedir ajuda – ela vai ter que conviver para sempre com aquela mulher que “a segue” e com quem ninguém mais parece se importar… pedir ajuda a qualquer pessoa pode fazer com que essa pessoa se aproxime dela e, consequentemente, desapareça da sua vida para sempre. É com esse entendimento que Ruby vive os próximos anos de sua vida, “sempre distante”, com a mente em outro lugar, incapaz de se estabelecer em um relacionamento, por exemplo.

Sozinha.

E, então, chegamos a 2046 – Ruby Sunday tem 40 anos de idade e Roger ap Gwilliam está prestes a ser eleito primeiro-ministro… e Ruby ainda se lembra do que o Doctor dissera sobre ele… então, ela entra como voluntária para ajudar na campanha de Roger e o acompanha de perto, presenciando sua eleição e descobrindo por ela mesma o tipo de pessoa que ele é: um político armamentista e sem respeito algum a direitos humanos, como infelizmente temos visto pipocar no mundo nos últimos anos. Então, Ruby resolve usar a sua “fiel companheira” para algo bom, E QUE CENA FASCINANTE A DO ESTÁDIO DE FUTEBOL! Ruby caminhando no meio da grama até estar a exatas 73 jardas de Roger ap Gwilliam, para que a mulher que a segue “o coloque para correr”.

Ele renuncia ao cargo, Ruby salva o país.

Quiçá o mundo.

Ruby Sunday vive mais 40 anos dessa maneira estranha… inexplicável. O Doctor nunca mais apareceu, a TARDIS nunca mais saiu do lugar onde pousou em 2024, e Ruby nunca mais esteve “sozinha” – se contarmos a sua companhia “sempre distante”, a 73 jardas. Debilitada e sentindo o fim de sua vida se aproximando, Ruby retorna a Cardiff para visitar a TARDIS, depois de anos sem ter estado ali… e ela conversa com uma TARDIS que já se tornou parte da paisagem e com um Doctor “inexistente” sobre sua vida, sobre como não soube mais sobre a mãe e como nunca descobriu quem era sua mãe biológica, e sobre como, mesmo depois de tudo isso, ela ainda “ousa ter esperanças”. Depois, deitada em uma cama, Ruby vê a mulher se aproximar pela primeira vez…

E, então, ela descobre algo que deduzimos há algum tempo: que aquela mulher é ela mesma. QUE SEQUÊNCIA FINAL MARAVILHOSA! Meu coração acelerou com a aproximação delas, com a Ruby estando do outro lado, agora, vendo a chegada dela e do Doctor em 2024, vendo como ela era jovem, e pedindo que “ele não pise”, na esperança de que, de alguma maneira, eles escutem… de alguma maneira, o círculo não seja rompido afinal. E não é. A Ruby de 2024 não se lembrará, de verdade, desses 82 anos vividos sem o Doctor e com uma “companhia” sempre distante, mas a sensação dessa vida de alguma maneira permanece nela – afinal de contas, ela dissera que esteve ali três vezes, não dissera? E a verdade é que ela só consegue se “lembrar” de duas.

Tudo foi respondido? Não. Mas não é preciso para o episódio ser EXCELENTE mesmo assim.

Eu estou completamente fascinado, entregue. Isso é “Doctor Who”.

  

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