JUSTIÇA – Segunda-feira (Vicente)


Fiquei absurdamente encantado por esse primor de minissérie. Eu ainda não tinha decidido acompanhá-la quando as propagandas começaram, mas assim que ela foi ao ar… eu me encantei pelo formato instantaneamente. Com o tempo, eu me encantei com a escrita impecável desse roteiro arrepiante. É uma forma nova de fazer televisão, e eu adorei. Com criatividade na forma de organizar o roteiro e inteligência para a construção de algo tanto complexo quanto emocionante (e real), Justiça certamente vai fazer história – e eu já estou esperando o lançamento do box pela Globo para que eu possa comprá-lo e reassistir à brilhante minissérie. Escrito por Manuela Dias, a minissérie se propõe a contar a história de quatro pessoas que são presas na mesma noite, e são soltas sete anos mais tarde. Alguns buscando reconstruir sua vida, muitos deles buscando vingança, eu acho que a série é eficaz ao levantar discussões extremamente pertinentes sobre a própria natureza do ser humano e a maneira como nós pensamos ou agimos. Nos colocamos em seus lugares muitas vezes. Pensamos nas coisas que faríamos se estivéssemos em seus lugares, embora não saberemos de fato até estarmos.
Mas percebemos que faríamos muito de tudo aquilo…
A série começa com a história de segunda-feira. Talvez, ao assistir a primeira segunda, ainda pareça uma trama normal. A alternância no protagonismo e nos enfoques de uma mesma história mais ampla são, no entanto, a principal característica de Justiça. A autora tornou Justiça, que já tinha uma história EXCELENTE em uma coisa diferente que desse ainda mais vontade de acompanhar. É incrível assistir a semana toda e perceber as pessoas se juntando, como um grande quebra-cabeça que não existe isoladamente. Elisa sofre com a morte da filha e é, também, a patroa de Fátima, protagonista da história de terça-feira. Seu marido tinha envolvimento lá com a empresa de Antenor, da história de sexta-feira. E assim por diante. Assim, as histórias vão se completando lentamente, indo e voltando no tempo a cada sequência de 4 episódios para que tenhamos todas as vistas possíveis e, em nossas mentes, possamos formar o panorama completo. Eu adorei. A fotografia da série também estava linda – cenários, figurinos –, a trilha sonora era arrepiante, e o sotaque deles era perfeitamente regional e cativante.
Estudei Letras, eu adoro sotaques.
Mas falemos da história de segunda-feira, Vicente Menezes (Jesuíta Barbosa). Não é apenas a história dele, mas escolhi manter o título, ao menos, nas quatro pessoas que foram presas naquela noite. Vicente foi preso por matar Isabela, sua noiva, ao encontrá-la transando com outro cara no chuveiro. Durante os 7 anos que Vicente passou na cadeia, Elisa (Débora Bloch), a mãe de Isabela, não conseguiu superar a morte da filha, e treinou durante todo esse tempo para que pudesse matá-lo assim que ele saísse da cadeia. Ela não conseguiu. Embora preparada, esperando por ele do lado de fora quando os portões se abriram, Elisa não conseguiu porque viu o Vicente com uma família, e uma filha. Enquanto Vicente, agora arrependido de verdade de tudo o que fez, tenta reconstruir sua vida fora da cadeia, seguindo em frente e tentando conseguir o perdão de Elisa (o que é bastante complicado, moralmente falando), os dois vão lentamente se envolvendo em uma espécie de relação confusa e doentia que ameaça acabar com a vida de ambos…
E de certa forma o faz, por muito tempo.
Acredito que há um quesito humano muito forte envolvido na trama toda. Eu não acho que Elisa estivesse certa em querer matar o Vicente, mas também não posso dizer que não tente entender seu sentimento. Ao mesmo tempo, ela destruiria sua vida. Por outro lado, acho que o fato de ela não ter matado o Vicente deveria ser o suficiente para ele, que devia viver com Regina e sua filha, Isabela, e então todos poderiam seguir em frente… mas ele quer o perdão de todo modo, que eu não sei se pode ser dado. Houve a morte de um filho envolvida, não sei como olhar para alguém e dizer, de fato, “Eu te perdoo”. Assim, tudo vai se tornando, lentamente, muito doentio. Eles se aproximam. Elisa e Vicente se aproximam em um impacto meio traumático, mas ela aceita ajudá-lo no projeto de mestrado, depois um já está dando carona para o outro para casa, ela está conseguindo para ele um emprego na biblioteca da universidade, depois Vicente já está frequentando a casa de Elisa e, talvez um dos piores, Elisa aceita ser madrinha de batismo de Isabela, a filha de Vicente com Regina, que leva o mesmo nome da filha de Elisa, assassinada.
Parece-me toda uma questão de projeção doentia. Talvez Elisa projete em Isabela de Vicente uma maneira de recobrar um pouco de sua própria filha – muitas teorias giraram em torno de Elisa sequestrar Isabela, o que não chegou a acontecer. Vicente projeta em Elisa, provavelmente, o seu desejo por perdão, porque embora tenha passado todos aqueles anos na cadeia, ele mesmo ainda não se perdoou. Parece que saber que Elisa o perdoou vai tornar tudo mais verdadeiro. Elisa talvez veja em Vicente algum resquício de sua filha. Não sei ao certo. Mas tudo é muito intenso, emana muita dor e gera muita controvérsia. Em determinado momento você tem uma noção clara de para onde tudo está se encaminhando… e quando Vicente descobre que Elisa estava o esperando do lado de fora da cadeia preparada para matá-lo, ele vai atrás dela pedir explicações. E em um acesso de fúria e paixão (não no sentido romântico, que fique bem claro – mais no sentido de calor do momento), Vicente e Elisa passam a noite juntos…
Ali foi um desespero.
Eu temi pelo o que ia acontecer demais. Eu temi que Regina fosse matar um dos dois – quer dizer, ela entrou na casa em um acesso de raiva dela mesma. Mas não. Aquele era, talvez, a chance de Elisa e Vicente tentarem seguir em frente novamente, separadamente. Elisa não pôde lidar com a culpa do que fez. Voltou a ser a Elisa do começo da série. Vicente estava mais que disposto a ser feliz com a família, e me doía ver Regina e Isabela o esperando para o jantar. Isabela com o desenho que ia dar de presente ao pai quando ele chegasse. Regina muito mais fofa do que nunca, em toda sua esperança de finalmente ser feliz com Vicente. Mas quando Vicente está levando Elisa para casa, eles sofrem um acidente. E, recusando-se a ligar para pedir socorro enquanto assistia Vicente morrer na sua frente, talvez Elisa tenha se sentido vingada. Eu sofri. Eu sofri pela família que Vicente deixou para trás. Mas aquela foi a gota d’água para que Elisa voltasse a viver sua vida. Limpou o quarto da filha assassinada, colocou tudo para doação, sentiu que aquela história, de certa maneira, tinha chegado ao fim. Embora tenha ido ao cemitério.
Onde também estava Fátima e Firmino em uma finalização não mostrada na terça.
Fica para quinta.
Mas, do fim disso tudo, o que eu tirei foi que a história se repete… quer dizer, Regina achando que Elisa é culpada pela morte de Vicente, treinando tiro no final daquele episódio… aquilo foi assustadoramente parecido com Elisa treinando para matar Vicente quando ele saísse da cadeia.
Como funciona a mente humana…

Próxima postagem de Justiça, EM BREVE!


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