Hoje é dia de Maria, Segunda Jornada – Episódio 3: O Julgamento

“O mundo não é esse que vês. O mundo ainda está por ser feito”

A identidade teatral de “Hoje é dia de Maria” é, certamente, o que mais me fascina na minissérie – e isso foi intensificado durante a segunda jornada de Maria. Com muita beleza, música e poesia, a jornada de Maria e Dom Chico Chicote na cidade grande continua, em busca de qualquer trocado que lhes permita comprar alguma coisa que possa matar a sua fome, enquanto eles conversam sobre a vida, sobre o mundo e Maria descobre o mundo no qual não quer viver, e se pergunta se, algum dia, conseguirá retornar para casa. “O Julgamento” traz, além de Dom Chico Chicote e a amiga Lavadeira de Maria às voltas com a “justiça”, o encontro do amor com a estreia oficial de Letícia Sabatella na segunda jornada de Maria, como a cigana espanhola Alonsa.

Se na primeira jornada, Letícia Sabatella interpretara uma versão adulta da própria Maria, na segunda jornada de “Hoje é dia de Maria”, ela retorna como uma nova personagem: Alonsa, uma mulher colorida e fascinante que canta pelas ruas, se defende de pessoas maldosas e causa encanto imediatamente em Dom Chico Chicote, que a chama de “Rosicler”, parecido com como Dom Quixote vê sua amada Dulcinéia em pessoas que não são ela, mas de maneira mais consciente do que o outro personagem. Acho particularmente interessante como “Hoje é dia de Maria” traz tanto Letícia Sabatella quanto Rodrigo Santoro de volta à narrativa com novos personagens, mas ainda como um casal apaixonado, que nos proporciona certa sensação de familiaridade.

O episódio também traz um pouco do Dr. Copélius e da Dona Boneca em uma das cenas mais simples e mais bonitas dessa segunda jornada, quando a Dona Boneca pergunta o porquê de o Dr. Copélius a estar ajudando daquela maneira, se “ela é apenas uma boneca velha”, e ele derruba toda aquela coisa da descartabilidade da vida humana em uma cena emocionante na qual eles dançam juntos e mais nada precisa ser dito… é muito bonito! Enquanto isso, Asmodeu continua na cola de Maria, louco para encontrar a sua estrela e “levá-la de volta para a o teatro”, com Maria sempre escapando por um triz, mas quase caindo na tentação do Asmodeu Marinheiro quando ela se vê sozinha nas ruas da cidade grande e é tentada a se jogar no Mar do Esquecimento.

Uma das cenas mais legais de “O Julgamento” acontece quando Dom Chico Chicote fica fascinado pelo binóculo que Maria ganhara da Menina Carvoeira no início da jornada, dizendo que aquele é um raro objeto mágico que mostra como as coisas realmente são e aquilo que nunca morre: o amor. E, através do binóculo, Maria vê a sua amiga Lavadeira sendo injustamente levada presa e percebe quem ela realmente é: Nossa Senhora Aparecida. Sofrendo e chorando profusamente, Maria lamenta viver em um mundo no qual nem o sagrado é respeitado e, em parte, “Hoje é dia de Maria” nos diz, aqui, que talvez seja justamente nesse mundo que mais precisamos de pessoas como a Maria… onde a sua bondade pode plantar sementes e mudar o mundo.

A justiça medonha, que leva Nossa Senhora Aparecida/a Lavadeira para o desespero de Maria, também acaba pegando o Dom Chico Chicote e o colocando em julgamento. Acusado de ser um homem inútil para a cidade, com suas “invenções sem sentido” ou qualquer coisa assim, Dom Chico Chicote é colocado em um tribunal improvisado no meio do teatro, em uma cena interessantíssima que brinca com diferentes linguagens e com os bastidores da arte, porque, pela primeira vez, a câmera nos leva para cima, nos revelando um pouco da redoma em que “Hoje é dia de Maria” é filmada, aqui convertida quase em um picadeiro para o “espetáculo” que está prestes a se realizar, e vemos até mesmo as câmeras que filmam Dom Chico Chicote, propositalmente, porque combina com o cenário da cidade e com o momento.

“Hoje é dia de Maria” quebra barreiras impressionantes.

Eu amo essa obra de arte!

O julgamento é um show de horrores. Comandado pelo próprio Asmodeu como juiz (!), não há muita esperança para Dom Chico Chicote, ainda mais com os supostos advogados de defesa que são os mesmos que batiam em mortos na primeira jornada para cobrar dívidas que não foram pagas, e Maria e Alonsa, que assume oficialmente o nome de Rosicler de agora em diante, fazem um trabalho muito mais competente na defesa do inventor. A música de Chico Chicote e Rosicler é lindíssima, e a defesa de Maria tem tudo a ver com a personagem boa e com senso de justiça que sempre conhecemos, desde a primeira jornada… mas aquele julgamento era só um show, nunca foi pensado para ser justo, e Dom Chico Chicote é condenado à morte no Mar do Esquecimento.

Mas a execução é interrompida pelo despertar do gigante…

É hora da guerra.

 

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